Acórdão: 0020362-68.2020.5.04.0007 (AP)
Redator: JOAO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA
Órgão julgador: Seção Especializada em Execução
Data: 15/09/2021

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO
Identificação

PROCESSO nº 0020362-68.2020.5.04.0007 (AP)
AGRAVANTE: SELTEC VIGILANCIA ESPECIALIZADA LTDA
AGRAVADO: ISMAEL VIEGAS SIMOES, CAIXA ECONOMICA FEDERAL
RELATOR: JOAO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA

EMENTA

AGRAVO DE PETIÇÃO. ATUALIZAÇÃO DOS DÉBITOS TRABALHISTAS. INDEXADOR. Aplicação das regras fixadas nas decisões proferidas nos autos das ADCs nºs 58 e 59 MC/DF pelo Supremo Tribunal Federal, em face a decisão vinculante das mesmas.

Agravo de petição interposto pela executada Seltec a que se nega provimento no item.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da Seção Especializada em Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento ao agravo de petição interposto pela executada Seltec Vigilância Especializada Ltda.

Intime-se.

Porto Alegre, 06 de setembro de 2021 (segunda-feira).

RELATÓRIO

Inconformada com a sentença proferida pela juíza Luciana Caringi Xavier, que julgou procedente em parte os embargos à execução, agrava de petição a executada Seltec Vigilância Especializada Ltda.

Insurge-se contra os seguintes itens: abatimento de valores e atualização monetária.

Há contraminuta.

O julgamento foi convertido em diligência para que a executada Seltec juntasse ao processo procuração válida, o que restou cumprido.

Processo não sujeito a parecer do Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

AGRAVO DE PETIÇÃO DA EXECUTADA.

1. ABATIMENTO DE VALORES.

A executada Seltec, alegando que as horas extras fizeram parte da base de cálculo do adicional de periculosidade quitado ao longo do contrato, pretende o abatimento, mês a mês, do valor pago a título de hora extras + o seu reflexo de 30% (trinta por cento) sobre o adicional em comento + o reflexo dessas horas extras sobre DSR no adicional em evidência.

Vejamos a decisão de primeiro grau (fls. 752/753 do pdf):

O exequente alega que a contadora não abateu, como devia, valores pagos durante o contrato a título de adicional de periculosidade majorado pela integração, em sua base de cálculo, do reflexo de horas extras em descanso semanal remunerado. Busca, portanto, a dedução/compensação de tais valores.

Houve deferimento, em sentença (ID. f4e742e - Pág. 6), da compensação de valores de horas extras pagas ao longo do contrato, mas não foi autorizada compensação ou dedução de valores a título de adicional de periculosidade, como pretende.

Ademais, a condenação abrangeu 'diferenças oriundas da inclusão do adicional de periculosidade na base de cálculo da rubrica 'hora intrajornada art. 71', paga ao reclamante ao longo do contrato, com reflexos em repousos, férias e 13º salário', ou seja, parcela que não havia integrado o adicional de periculosidade, não sendo, pois, passível de dedução por não consistir e parcela paga sob idêntica rubrica.

Julgo improcedentes os embargos no aspecto.

Deixou a executada de observar que o julgador assim fez constar na fl. 419 do pdf:

Observa-se que o pagamento das horas intervalares (pela supressão do período legal de intervalo) não consta no rol de rubricas sobre as quais será computado o adicional de periculosidade.

Efetivamente, cotejando os recibos de salário, (fls. 22-24 e 363-451), observa-se que o adicional de periculosidade é calculado sobre as rubricas de salário básico, e "variáveis" (que são as horas extras e horas de uniformização). Não se observa o cômputo da rubrica "hora intrajornada art. 71" na apuração do adicional de periculosidade.

Logo, julgo procedente a pretensão e condeno a reclamada ao pagamento de diferenças oriundas da inclusão do adicional de periculosidade na base de cálculo da rubrica "hora intrajornada art. 71", paga ao reclamante ao longo do contrato, com reflexos em repousos, férias e 13º salário.

Verifica-se ainda que foram deferidas as seguintes verbas: a) Horas extras a contar da 8ª diária e 44ª semanal, com reflexos; b) Diferenças de verbas rescisórias, na forma da fundamentação; c) Diferenças do piso normativo a contar de fevereiro de 2017 e reflexos; d) Diferenças da hora intrajornada pela inclusão do adicional de periculosidade na base de cálculo e reflexos; e) Dobra das férias do período aquisitivo 2015/2016 (fl. 424 do pdf). Nos seus fundamentos, quando do deferimento das horas extras, foi autorizada a compensação de valores de horas extras pagas ao longo do contrato, observados os critérios da OJ 415 da SBDI-1 do TST (fl. 418 do pdf).

Portanto, não é possível a dedução do adicional de periculosidade que integrou as horas extras do contrato, haja vista que o julgador examinando a matéria entendeu que somente seria devida integração do adicional de periculosidade nas horas intrajornada do artigo 71 da CLT.

Tal como referido pela magistrada a quo, não foi deferido qualquer abatimento a título de adicional de periculosidade, motivo pelo qual o deferimento do pedido afrontaria a coisa julgada e o artigo 879, parágrafo 1º, da CLT.

Desta forma, nega-se provimento ao agravo de petição interposto pela executada Seltec no item.

2. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.

Sustenta a executada Seltec que o débito trabalhista deve ser atualizado pela TR no decorrer de todo o período.

Vejamos a decisão de primeiro grau (fl. 752 do pdf):

A executada se insurge contra a utilização do IPCA-E, requerendo seja aplicada unicamente a TR por todo o período.

O critério de correção foi, inicialmente, estabelecido na decisão do ID. ID. 62f4d7f (TR/IPCA-E).

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, em decisão unânime proferida na sessão plenária de 18.12.2020, decretou a inconstitucionalidade da Taxa Referencial (TR) para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. Por maioria de votos, os ministros decidiram que, até que o Poder Legislativo delibere sobre a questão, devem ser aplicados o IPCA-E, na fase pré-judicial, e, a partir da citação, a taxa Selic.

A decisão seguiu o voto do ministro Gilmar Mendes, relator das Ações Declaratórias de Constitucionalidade 58 e 59 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5867 e 6021, com efeitos e modulação de efeitos apenas para resguardar ex tunc coisa julgada e pagamento.

Assim, determino a retificação da conta com aplicação do IPCA-E até a notificação inicial da executada, e a taxa SELIC a partir de então.

Afastado o IPCA-E como havia sido até então decidido, julgo parcialmente procedentes embargos no particular.

Cabe inicialmente fazer um breve histórico sobre os índices adotados pela Justiça do Trabalho.

Desde 1991, pela publicação da Lei nº 8.177/1991, Lei da Desindexação da Economia, esta determinava a atualização dos valores devidos na Justiça do Trabalho pela Taxa Referencial Diária (TRD).

No âmbito da Justiça do Trabalho da 4ª Região, a TR passou a ser expressa pelo índice FACDT. Em 14-03-2013 passou-se a adotar a Orientação Jurisprudencial n° 49, a qual fixava como índice o INPC, mas que foi cancelada em 18-09-2015.

Ato subsequente foi aprovada a Orientação Jurisprudencial Transitória nº 01, que fixava a aplicação do IPCA-E a contar de 30-06-2009, essa cancelada em 27-06-2017.

Por fim, o último entendimento aplicado no âmbito da SEEx era de que a TR deveria ser aplicada até 25-03-2015, e a partir de 26-03-2015, o IPCA-e, apesar da vigência da Lei n° 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que definiu a TR como índice de atualização tanto dos créditos decorrentes das condenações (artigo 879, parágrafo 7º, da CLT) quanto dos depósitos recursais (artigo 899, parágrafo 4º, da CLT).

Este último critério foi alterado em razão da Medida Cautelar na ADC nº 58, em decisão proferida em 27-06-2020 pelo Ministro Gilmar Mendes, o qual complementou sua decisão no Agravo Regimental interposto na data de 01-07-2020, onde foi determinada a suspensão do julgamento do item a que se referia à correção monetária. Prosseguiu-se o julgamento dos demais itens do agravo de petição, repartindo-se a decisão colegiada, conforme permitem os artigos 354 e 355, ambos do CPC.

Ocorre que citados processos - ADC nº 58 e ADC nº 59 foram julgados pelo Plenário do STF em 18-12-2020, tendo a íntegra do acórdão sido publicada em 07-04-2021, DJE nº 63.

Transcreve-se a seguir a íntegra da ementa e respectivo decisum:

EMENTA:

DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE. ÍNDICES DE CORREÇÃO DOS DEPÓSITOS RECURSAIS E DOS DÉBITOS JUDICIAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 879, §7º, E ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13. 467, DE 2017. ART. 39, CAPUT E §1º, DA LEI 8.177 DE 1991. POLÍTICA DE CORREÇÃO MONETÁRIA E TABELAMENTO DE JUROS.

INSTITUCIONALIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO POLÍTICA DE DESINDEXAÇÃO DA ECONOMIA. TR COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE.

PRECEDENTES DO STF. APELO AO LEGISLADOR. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES, PARA CONFERIR INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO AO ART. 879, §7º, E AO ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13.467, DE 2017. MODULAÇÃO DE EFEITOS.

1. A exigência quanto à configuração de controvérsia judicial ou de controvérsia jurídica para conhecimento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) associa-se não só à ameaça ao princípio da presunção de constitucionalidade - esta independe de um número quantitativamente relevante de decisões de um e de outro lado -, mas também, e sobretudo, à invalidação prévia de uma decisão tomada por segmentos expressivos do modelo representativo.

2. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, decidindo que a TR seria insuficiente para a atualização monetária das dívidas do Poder Público, pois sua utilização violaria o direito de propriedade. Em relação aos débitos de natureza tributária, a quantificação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança foi reputada ofensiva à isonomia, pela discriminação em detrimento da parte processual privada (ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e RE 870.947-RG - tema 810).

3. A indevida utilização do IPCA-E pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tornou-se confusa ao ponto de se imaginar que, diante da inaplicabilidade da TR, o uso daquele índice seria a única consequência possível. A solução da Corte Superior Trabalhista, todavia, lastreia-se em uma indevida equiparação da natureza do crédito trabalhista com o crédito assumido em face da Fazenda Pública, o qual está submetido a regime jurídico próprio da Lei 9.494/1997, com as alterações promovidas pela Lei 11.960/2009.

4. A aplicação da TR na Justiça do Trabalho demanda análise específica, a partir das normas em vigor para a relação trabalhista. A partir da análise das repercussões econômicas da aplicação da lei, verifica-se que a TR se mostra inadequada, pelo menos no contexto da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), como índice de atualização dos débitos trabalhistas

5. Confere-se interpretação conforme à Constituição ao art. 879, §7º, e ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil), à exceção das dívidas da Fazenda Pública que possui regramento específico (art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), com a exegese conferida por esta Corte na ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e no RE 870.947-RG (tema 810).

6. Em relação à fase extrajudicial, ou seja, a que antecede o ajuizamento das ações trabalhistas, deverá ser utilizado como indexador o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15/IBGE), em razão da extinção da UFIR como indexador, nos termos do art. 29, § 3º, da MP 1.973-67/2000. Além da indexação, serão aplicados os juros legais (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991).

7. Em relação à fase judicial, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, considerando que ela incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95; 84 da Lei 8.981/95; 39, § 4º, da Lei 9.250/95; 61, § 3º, da Lei 9.430/96; e 30 da Lei 10.522/02). A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.

8. A fim de garantir segurança jurídica e isonomia na aplicação do novo entendimento, fixam-se os seguintes marcos para modulação dos efeitos da decisão: (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão, em ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória, todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento, independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal, devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC.

9. Os parâmetros fixados neste julgamento aplicam-se aos processos, ainda que transitados em julgado, em que a sentença não tenha consignado manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais).

10. Ação Declaratória de Constitucionalidade e Ações Diretas de Inconstitucionalidade julgadas parcialmente procedentes.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Luiz Fux, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, julgar parcialmente procedente a ação, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 879, § 7º, e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de 2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros que vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio , nos termos do voto do Relator.

Brasília, Sessão 18 de dezembro de 2020.

Ministro GILMAR MENDES Relator

Cumpre ainda transcrever o seguinte trecho do acórdão em referência:

(...)

5. Do debate sobre a constitucionalidade da TR na Justiça do Trabalho

Essa breve recapitulação da jurisprudência do STF sobre a TR nos mostra que a jurisprudência desta Corte reconheceu a inconstitucionalidade da TR em duas hipóteses: (i) em relação à Lei de desindexação da economia, nos casos em que a lei nova determinou sua aplicação retroativa; (ii) em relação à Fazenda Nacional, nos casos em que a aplicação da TR importava em violação ao princípio da isonomia. Nos demais casos, a matéria ficou, a meu ver, submetida a uma verdadeira zona de penumbra jurídica.

(...)

Desse modo, o presente julgamento é uma oportunidade de esta Corte enfrentar duas questões que ainda não foram objeto de deliberação neste Tribunal: (i) saber se a TR como índice de correção monetária na Justiça Trabalhista é constitucional e, em se entendendo pela inconstitucionalidade, (ii) saber o que deve se colocar no lugar da TR.

Embora, como dito, o STF nunca tenha declarado a inconstitucionalidade da TR per se, reconheço que o entendimento majoritário da Corte tem indicado ou sinalizado a impossibilidade de utilização da TR como índice de correção monetária.

(...)

No entanto, com a ressalva de meu posicionamento pessoal, curvo-me ao entendimento da maioria, em respeito à colegialidade, para concluir que a TR se mostra inadequada, pelo menos no contexto da CLT, como índice de atualização dos débitos trabalhistas. Assim sendo, entendo assistir razão, em parte, à parte autora da ADI, e declaro a inconstitucionalidade da expressão "Taxa Referencial", contida no §7º do art. 879 da CLT.

Ressalto que, uma vez reconhecido que a TR não pode ser utilizada para atualização dos créditos trabalhistas, resta uma lacuna a ser sanada.

Se não podemos utilizar a TR, qual índice deverá ser utilizado? Nesse ponto, entendo equivocado o raciocínio apresentado pela autora da ação direta, que espelha o posicionamento majoritário do TST, no sentido de que, para a atualização dos débitos trabalhistas, deveria incidir o IPCA-E mais juros de 1% ao ano.

(...)

Sendo assim, posiciono-me pela necessidade de conferirmos interpretação conforme à Constituição ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil).

Desse modo, fica estabelecido que, em relação à fase extrajudicial, ou seja, a que antecede o ajuizamento das ações trabalhistas, deverá ser utilizado como indexador o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15/IBGE), em razão da extinção da UFIR como indexador, nos termos do art. 29, § 3º, da MP 1.973-67/2000.

Ainda quanto à fase extrajudicial, salienta-se que, além da indexação, devem ser aplicados os juros legais definidos no art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991, ou seja, a TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento. Note-se que a discussão em torno do referido dispositivo dizia respeito à sua aplicação analógica como disciplinadora da correção monetária, à míngua de dispositivo legal específico trabalhista antes do art. 879, § 7º, da CLT. Por outro lado, diante da clareza vocabular do art. 39, "caput", da Lei 8.177/91, não há como afastar sua aplicação, louvando-se na menção aos juros no art. 883 da CLT, na medida em que este último dispositivo consolidado refere-se exclusivamente à fase processual, sem definir índice ou percentual dos juros, até porque o objeto do comando é a penhora como fase da execução.

Em relação à fase judicial, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, considerando que ela incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95; 84 da Lei 8.981/95; 39, § 4º, da Lei 9.250/95; 61, § 3º, da Lei 9.430/96; e 30 da Lei 10.522/02). A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.

(...)

Desse modo, para evitarem-se incertezas, o que ocasionaria grave insegurança jurídica, devemos fixar alguns marcos jurídicos.

Em primeiro lugar, são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês.

Por outro lado, os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC).

Igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais).

De início cumpre transcrever o artigo 406 do CC (Lei nº 10.406/2002, D.O.U de 11-01-2002, pág. nº1, vigente a contar de 11-01-2003):

Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

No caso, a regra geral estabelecida a ser observada é a do artigo 406 do Código Civil. Segundo o dispositivo, quando não forem convencionados, os juros moratórios serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Atualmente, essa taxa é a Selic.

De acordo com o Ministro Dias Toffoli, a taxa SELIC é considerada a taxa básica de juros da economia, definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) como um conjunto de variáveis, como a expectativa de inflação e os riscos associados à atividade econômica: Trata-se, portanto, de taxa que engloba juros moratórios e correção monetária, razão pela qual sua incidência impede a aplicação de outros índices de atualização.

Assim, considerando que citadas ADCs julgaram inconstitucional a Taxa Referencial (TR) para a correção dos débitos trabalhistas e dos depósitos judiciais, passa-se a adotar a referida decisão, listando as seguintes regras para sua aplicação:

1 - o marco para aplicação dos índices fixados é a data da citação, considerando-se como fase pré-judicial o dia anterior à data de citação; a fase judicial se inicia no próprio dia em que ocorreu a citação;

2 - os índices para a correção dos débitos trabalhistas deve ser o IPCA-e até o dia anterior à citação e após, a taxa SELIC;

3 - na fase extrajudicial deverá ser utilizado como indexador o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15/IBGE);

4 - não mais se aplicam juros moratórios, pois estes são devidos apenas a partir da citação, que coloca em mora o devedor, e aí, os juros moratórios estão englobados na taxa SELIC;

5 - juros na fase judicial não existem, pois, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, considerando que ela incide como juros moratórios dos tributos federais (artigos. 13 da Lei nº 9.065/1995; 84 da Lei nº 8.981/1995; 39, parágrafo 4º, da Lei nº 9.250/1995; 61, parágrafo 3º, da Lei nº 9.430/1996; e 30 da Lei nº 10.522/2002). A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.

6 - todos os pagamentos realizados, utilizando a TR, IPCA-e ou qualquer outro índice (INPC, cite-se OJ nº 49 da SEEx), no tempo e modo oportunos, seja de forma judicial ou extrajudicial, inclusive depósitos judiciais, são declarados válidos e não podem ser rediscutidos os índices aplicados, seja na mesma ação ou por interposta nova ação;

7 - devem ser mantidas e executadas todas as sentenças que transitaram em julgado (considerando-se tanto a fase de conhecimento ou de execução) que expressamente adotaram, na sua fundamentação e ou dispositivo, a TR ou IPCA-e (ou INPC, cite-se OJ nº 49 da SEEx);

8 - todos os processos em curso que se encontram sobrestados, (independentemente de estarem com ou sem sentença, mesmo na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa SELIC (juros e correção monetária);

9 - a eficácia erga omnes e efeito vinculante atinge inclusive os processos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa (leia-se registro expresso) sobre os índices de correção monetária e igualmente sobre a taxa de juros (omissão ou simples referência de seguir os critérios legais);

10 - inaplicável a preclusão em processos em andamento e que estão na fase de liquidação, devendo ser respeitada a decisão vinculante do STF, que não fez ressalva à preclusão. Observe-se que isto pode acarretar, inclusive, decisão prejudicial a quem interpõe o recurso, o que, em tese, é absurdo, mas se enquadra na situação atípica trazida pela decisão do STF, que é obrigatória e vinculante para casos não transitados em julgado e pelo princípio de interpretação restritiva dos casos de flexibilização do decidido.

Finalizando, deve-se dizer que a decisão vinculante do STF deve ser aplicada de imediato, independentemente da publicação do acórdão (este já publicado em 07-04-2021, DJE nº 63) e mesmo antes do julgamento de eventuais embargos declaratórios, nos termos de precedentes de jurisprudência do próprio STF.

Assim, passa-se ao exame do caso em concreto.

Verifica-se que a sentença na fase de conhecimento não fixou os índices de correção monetária e juros a serem utilizados nos cálculos, remetendo sua análise à liquidação da sentença (fl. 423 do pdf), não sendo discutida tal questão em sede recursal (fl. 428 do pdf).

Portanto, não existe coisa julgada sobre tais matérias.

Foram homologados os cálculos apresentados pela perita oficial às fls. 681/699 do pdf (fl. 700 do pdf), referentes ao período de 16-07-2014 a 19-04-2017, atualizados pela TR até 25-03-2015 e pelo IPCA-E a partir de 26-03-2015.

Assim sendo, em observância às regras acima fixadas, no curso da fase pré-judicial deve ser adotado o IPCA-E e, a contar da data da citação inicial deve ser aplicada a taxa SELIC (nesta já englobados os juros de mora), em cumprimento ao comando do STF, o qual não pode ser contrariado e considerando que o julgador já decidiu de acordo com os fundamentos retroexpendidos, inviável qualquer reforma no item.

Portanto, nega-se provimento ao agravo de petição interposto pela executada Seltec no item.

JOAO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA

Relator

VOTOS

DEMAIS MAGISTRADOS:

Acompanham o voto do(a) Relator(a).

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR JOÃO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA (RELATOR)

DESEMBARGADOR MARCELO GONÇALVES DE OLIVEIRA (REVISOR)

DESEMBARGADORA CLEUSA REGINA HALFEN (NÃO VOTA)

DESEMBARGADORA MARIA DA GRAÇA RIBEIRO CENTENO

DESEMBARGADORA LUCIA EHRENBRINK

DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO MAY