PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO
Identificação

PROCESSO nº 0020862-58.2020.5.04.0000 (MSCiv)
IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
AUTORIDADE COATORA: MAGISTRADO(A) DA 2ª VARA DO TRABALHO DE PASSO FUNDO
RELATOR: MARCOS FAGUNDES SALOMAO

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA. AUTO DE INFRAÇÃO. TERMO DE INTERDIÇÃO. COVID-19. A Portaria nº 1.069, de 23 de setembro de 2019, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, legitima os Auditores-Fiscais do Trabalho, em todo território nacional, a "ordenar a adoção de medidas de interdições e embargos, e o consequente levantamento posterior dos mesmos, quando se depararem com uma condição ou situação de risco iminente à vida, à saúde ou à segurança dos trabalhadores.". Por meio do julgamento de sete Ações Diretas de Inconstitucionalidade, em 29/04/2020, o STF suspendeu a eficácia do art. 31 da Medida Provisória nº 927/2020, permanecendo vigente a Portaria nº 1.069, de 23 de setembro de 2019, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, no tocante à atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho. Seus atos administrativos gozam de presunção de legitimidade, veracidade e legalidade. Assim, o Termo de Interdição expedido pelo Ministério da Economia - Secretaria Especial da Previdência e Trabalho, Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, Superintendência Regional do Trabalho no Rio Grande do Sul, baseado em fiscalização procedida por Auditores-Fiscais do Trabalho, que goza de presunção de legitimidade, veracidade e legalidade, prevalece como meio de prova, no âmbito de ação mandamental, sobre laudo pericial que não vincula o juízo (art. 479 do CPC c/c art. 769 da CLT) e que não goza das mesmas prerrogativas dos atos dos Auditores-Fiscais do Trabalho, e cujas conclusões são bastante fragilizadas pelas demais provas dos autos, evidenciando o direito líquido e certo do impetrante, que estaria, por si só, comprovado pela questão de maior relevância deste mandado de segurança (a proteção à saúde e à vida dos empregados da litisconsorte, de suas famílias e de toda comunidade em geral das cidades onde habitam, expostos ao estado de calamidade pública gerado pela COVID-19). Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: Por maioria de votos, CONCEDER A SEGURANÇA para, confirmando a liminar deferida neste mandado de segurança, cassar em parte a liminar proferida na ação subjacente nº 0020284-43.2020.5.04.0664, que tramita perante a 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS, restabelecendo o Termo de Interdição nº 4.042.302-6, até que a litisconsorte JBS AVES LTDA. comprove o atendimento rigoroso e integral do mesmo, sob pena de multa de R$ 10.000,00, por dia e por empregado, sem prejuízo de outras medidas que visem dar efetividade à presente decisão, em caso de funcionamento da sede do Município de Passo Fundo/RS, sem cumprir as exigências do Auto de Interdição. Prejudicado o agravo regimental. Custas não incidentes.

Intime-se.

Porto Alegre, 22 de junho de 2020 (segunda-feira).

RELATÓRIO

Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, contra ato do Exmo. Juiz LUCIANO RICARDO CEMBRANEL, proferido nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Auto de Interdição nº 0020284-43.2020.5.04.0664, que tramita perante a 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS. O suposto ato coator consiste na decisão que, em sede de antecipação de tutela, julgou insubsistente a interdição. Atribui à causa o valor de R$ 100.000,00.

O pedido liminar do mandado de segurança foi deferido (ID. 31479f6).

A litisconsorte JBS AVES LTDA. apresenta Agravo Regimental (ID. e4e4c8c), que é recebido apenas no efeito devolutivo (ID. 0935852).

A litisconsorte JBS AVES LTDA. junta decisão proferida nos autos da Correição Parcial nº 1000465-69.2020.5.00.0000, que tramita perante o Tribunal Superior do Trabalho, na qual foi deferida "a liminar requerida para conceder efeito suspensivo ao Agravo Regimental interposto à decisão proferida no Mandado de Segurança nº 0020862-58.2020.5.04.0000, até o julgamento pelo órgão competente" (ID. e62e603).

O impetrante apresenta contrarrazões ao Agravo Regimental (ID. 4b4571d).

A litisconsorte UNIÃO FEDERAL (AGU) não apresenta contestação ao mandado de segurança, nem contrarrazões ao Agravo Regimental (ID. 696bf4c).

A autoridade impetrada prestou informações (ID. 4c75582).

Determinado o envio dos autos à Vice-Presidência para mediação, não houve êxito (ID. f3cf386).

O Ministério Público do Trabalho emite parecer, ID. e9b069d, opinando pela concessão da segurança.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

MANDADO DE SEGURANÇA. AUTO DE INFRAÇÃO. TERMO DE INTERDIÇÃO. COVID-19

Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, contra ato do Exmo. Juiz LUCIANO RICARDO CEMBRANEL, proferido nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Auto de Interdição nº 0020284-43.2020.5.04.0664, que tramita perante a 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS. O suposto ato coator consiste na decisão que, em sede de antecipação de tutela, julgou insubsistente a interdição. O impetrante narra que "A empresa JBS AVES LTDA. ajuizou em 27 de abril de 2020 Ação Declaratória de Nulidade de Auto de Interdição, com pedido de tutela de urgência, autuada sob o nº 0020284-43.2020.5.04.0664, requerendo a imediata suspensão dos efeitos do termo de interdição número 4.042.302-6, o qual determinou a interdição total do estabelecimento, em virtude da caracterização de grave e iminente risco à vida e à saúde dos trabalhadores, bem como da população em geral, decorrente de surto descontrolado de COVID-19 verificado nas dependências da empresa" (grifos no original). Afirma que, no dia 28/04/2020, o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS determinou a reunião da ação matriz acima referida com a Ação Civil Pública nº 0020265-43.2020.5.04.0662, ajuizada dias antes pelo Ministério Público do Trabalho em face da empresa litisconsorte, na qual busca a adoção urgente de medidas de saúde e segurança do trabalho a fim de coibir o surto do Coronavírus; e determinou, ainda, a juntada da perícia realizada na Ação Civil Pública como prova emprestada. Produzidas provas, foi proferido o ato coator, analisando em conjunto a ação subjacente e a Ação Civil Pública, no sentido de julgar insubsistente a interdição, "exceto: a) no que tange à necessidade de comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, devendo ser impedido de ingressar na condução aquele que apresentar tais sintomas; e b) em vista do possível contágio comunitário, conforme relatório Epidemiológico da Secretaria de Saúde do Município de Passo Fundo, de 22/4/2020, limitada, neste aspecto, ao período de incubação de 14 dias, contados de 24/4/2020. No particular, afasto a exigência de realização de testes em todos os empregados antes do retorno ao trabalho [...]". Argumenta que, diante de tal decisão, a litisconsorte JBS ficou autorizada a retomar suas atividades a partir de 09/05/2020, sem adotar as medidas de proteção requeridas pelo impetrante na Ação Civil Pública, expondo a vida e a integridade física de 2.625 trabalhadores ativos que fazem parte da cadeia produtiva da litisconsorte, além da população em geral, considerando as pessoas que possuem contato com os empregados da litisconsorte e que laboram em outros estabelecimentos, que, por sua vez, também podem contaminar colegas de trabalho e seus familiares, ocasionando um surto generalizado. Defende o cabimento e a tempestividade do mandado de segurança, invocando os arts. 5º, LXIX, da Constituição Federal; 1º e 5º da Lei nº 1.533/51; 23 da Lei nº 12.016/2009; e a Súmula nº 414, II, do TST. Discorre o histórico de contágio dos empregados da litisconsorte pelo Coronavírus: no dia 09/04/2020, foram confirmados os dois primeiros casos de COVID-19; no dia 19/04/2020, havia sete casos confirmados, ingressando o impetrante com a Ação Civil Pública com o objetivo de impor à empregadora a adoção de medidas emergenciais para conter o surto, o que foi indeferido naquela ação; em 23/04/2020, foi lavrado o Termo de Interdição nº 4.402.302-6, havendo 19 casos confirmados e 117 suspeitos; em 27/04/2020, com 48 casos confirmados, a litisconsorte ajuizou a Ação Declaratória de Nulidade do Auto de Infração, quando também o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo negou o pedido de reconsideração formulado pelo impetrante na ACP. Frisa que, nesta data de 27/04/2020, o Município de Passo Fundo possuía 130 casos confirmados, com taxa de 66 casos por 100.000 habitantes, enquanto a litisconsorte possuía 48 infectados, com taxa de 1.828,57 casos por 100.000 trabalhadores, representando índice 28 vezes superior à taxa do Município, e que, excluindo os casos dos trabalhadores da litisconsorte do número de infectados do Município, essa taxa seria de quase 37 vezes superior à média local. Destaca que os casos de infectados na litisconsorte foram superiores, inclusive, aos contatados em empregados do maior Hospital de Passo Fundo, que é referência no tratamento da COVID-19. Alude que, "Até o dia de ontem, passados 12 dias da total paralisação das atividades no estabelecimento, havia 62 casos da Covid-19 confirmados de empregados da unidade da litisconsorte, além de 11 "casos secundários positivos", 06 óbitos relacionados (Doc. 12). Considerando os 62 empregados da empresa e os 11 casos a eles relacionados (total de 73), verifica-se que a empresa litisconsorte ainda é responsável por 1/3 dos casos confirmados no Município de Passo Fundo, conforme informações da Secretaria Estadual de Saúde na data de 06/05/2020" (grifos no original), e que, caso não houvesse a interdição desde abril, provavelmente todos os trabalhadores da litisconsorte estariam infectados no momento. Salienta que "o presente Mandado de Segurança visa a atacar exclusivamente o ato que determinou a suspensão da interdição, por ser, ao menos neste momento, o mais grave e atentatório à saúde do trabalhador e de toda a população da região, merecendo, pois, prioridade em sua cassação". Entende que o ato coator viola direito líquido e certo, pois os Auditores-Fiscais do Trabalho estabeleceram um rol de medidas mínimas a serem implementadas, em situações de risco grave e eminente à saúde dos trabalhadores da litisconsorte, considerando os casos confirmados pela COVID-19 da empresa, o que demonstra a grave situação constatada. Pondera que, no termo de interdição, os Auditores, a partir da fiscalização procedida, determinaram o "afastamento imediato todos os empregados do estabelecimento até que fossem realizados os testes adequados para identificação da COVID-19 para TODOS os trabalhadores da planta, custeados pela empresa", tendo expressamente condicionado o retorno ao trabalho à "finalização do exame, com resultado negativo". Como alternativa, autorizou-se também que a empresa mantivesse "TODOS os seus trabalhadores em isolamento por 14 dias, realizando o teste então apenas nos casos que apresentem sintomatologia compatível com COVID-19 nesse período e nos contactantes destes Além disso, condicionou o retorno às atividades à adoção das seguintes medidas: a) realização de ajustes no sistema de transporte, a fim de viabilizar a rastreabilidade dos trabalhadores, garantir distanciamento interpessoal, e impedir o embarque de pessoas sintomáticas; b) Garantir o distanciamento dos trabalhadores, observando-se, nas áreas comuns, no mínimo 1,50 e no setor produtivo, 2 metros, podendo ser reduzido para 1 metro mediante o uso de EPIs eficazes para impedir a transmissão do novo coronavírus; c) interrupção imediata do uso aleatório de máscaras, sem qualquer critério ou protocolo para fabricação, higienização e periodicidade de troca; d) notificação imediata de casos de sintomas gripais ou sintomas compatíveis com a COVID-19 para os órgãos competentes; e) Afastamento imediato de todos os trabalhadores confirmados ou contactantes de casos suspeitos ou confirmados de estarem com COVID-19, pelo período mínimo de 14 dias; f) realizar busca ativa por contactantes, rastreando todos os indivíduos que tiveram contato com o trabalhador afetado, de forma célere e criteriosa, compartilhando imediatamente com os órgãos de saúde as informações; g) rastrear e afastar trabalhadores com morbidades pré-existentes; h) abster de desconsiderar relatos de trabalhadores que porventura indiquem a existência de sintomas de COVID-19; i) implementar de forma efetiva contato e acompanhamento (e exame clínico ou encaminhamento para atendimento clínico quando pertinente) de trabalhadores sintomáticos, afastados ou faltantes; j) se abster de receber atestados médicos de caso de suspeita ou caso confirmado de COVID-19 em formato físico; k) comprovar que o sistema de ventilação e circulação de ar é eficaz para impedir a propagação do coronavírus em todos os ambientes, por meio de laudo técnico elaborado por profissional habilitado, com emissão de anotação de responsabilidade técnica; l) se abster de promover a utilização de objetos de forma coletiva; m) alterar seu sistema de oferta de água potável aos trabalhadores, para evitar a aproximação da boca e rosto das pessoas" (grifos no original). Relata que nenhuma das medidas foi cumprida pela litisconsorte a fim de que a interdição pudesse ser levantada e que o ato coator, na forma em que proferido, autorizou a retomada das atividades sem a adoção das medidas mínimas para evitar novos contágios, pois não imposto nenhum critério de seleção e especificação dos empregados saudáveis e aptos para retornar ao trabalho, colocando em risco toda estratégia de contenção até então estabelecida. Alega que o ato coator se fundou, quase que exclusivamente, em laudo pericial produzido na ACP e nas alegações da litisconsorte, atribuindo valor probatório, praticamente, zero ao ato de interdição e relatórios produzidos pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, fiscais da Vigilância Sanitária Municipal e do setor de perícias do MPT, que atestaram a ineficácia ou a simples ausência de implementação das medidas necessárias ao combate do Coronavírus. Advogada que o laudo pericial produzido pela perita Sabine Chedid possui vícios graves, inclusive pelo tempo bastante reduzido em que a expert analisou as condições de saúde existentes na litisconsorte. Junta fotos extraídas da sede da empresa, apontando irregularidades. Sustenta que a realização de exames é fundamental para reduzir o contágio e o surgimento de novos infectados, uma vez que somente os testes laboratoriais são capazes de descartar os casos de infecção por COVID-19, explicando acerca do exame adequado a ser utilizado. Afirma que a busca ativa ou investigação epidemiológica são essenciais para evitar o ingresso de trabalhadores que tenham tido contato próximo com casos suspeitos ou confirmados de Coronavírus, constando expressamente no art. 1º, VII, VIII e IX, da Portaria nº 283/2020 da Secretaria Estadual da Saúde. Reitera que pretendeu o afastamento dos empregados da litisconsorte por um período mínimo de 14 dias para identificação dos casos confirmados, ciência do grupo de trabalhadores atingidos e melhor definição das estratégias de isolamento para conter o surto instalado, o que não foi realizado pela empresa, sendo, assim, impossível estabelecer o mesmo prazo de retorno ao trabalho por todos os empregados, salientando que, na data de hoje, conforme levantamento da 6ª Coordenadoria Regional de Saúde, "existem 62 casos confirmados na unidade, além da morte de 6 contactantes de trabalhadores, o que indica, de forma irrefutável que, durante o período de afastamento e incubação do vírus, houve a manifestação da doença em diferentes momentos pelos trabalhadores, contaminação em cadeia que pode ainda não ter finalizado. Denota-se, ainda, que a empresa não pretende realizar tais procedimentos mínimos de controle para o retorno seguro dos trabalhadores, uma vez que, conforme pedidos protocolados perante o Ministério da Agricultura, solicitou autorização para abate do limite máximo de aves da unidade (310 mil aves/dia) já nos dias 09 (sábado), 10 (domingo) e 16 (sábado) de maio, volume, por si só, incompatível com um retorno gradual de atividades e com um quadro reduzido de empregados, expondo-os a 8 dias consecutivos de trabalho em ritmo excessivo e em manifesta violação ao próprio repouso semanal remunerado (Doc. 14). Assim, sob nenhuma hipótese poderia ser admitida a retomada das atividades sem que, ao menos, a empresa proceda à análise clínica individualizada e à testagem específica de empregados com sintomas compatíveis com COVID-19 ou contactantes de casos suspeitos ou confirmados, o que implica, logicamente, uma busca ativa durante o período de afastamento, sob pena de se alastrar, novamente, o surto da doença na planta frigorífica" (grifos no original). Discorre sobre a imprescimbilidade na adoção correta do distanciamento entre os empregados, constando, no laudo de interdição, que eles trabalham ombro a ombro ou sem barreira física, em que pese as alegações da litisconsorte de que cumpre as medidas necessárias. Argumenta que, "De fato, a empresa implantou em alguns setores anteparos físicos constituídos de plásticos filme improvisados de forma aleatória no ambiente e sem qualquer critério relacionado a espaçamento, a altura apta a ensejar a efetiva proteção da zona respiratória do trabalhador, a seleção de material adequado ou mesmo a conformação, caracterizando-se, em verdade, como mais uma superfície com potencial risco para contaminação. A ineficácia desse sistema é patente, como demonstram as seguintes fotografias extraídas ao auto de infração [...]". Pondera que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos e da Administração de Segurança e Saúde Ocupacional elaborou orientação para o setor de processamento de carnes e aves, em 26/04/2020, recomendando a distância mínima de 1,80m, além da utilização de barreiras físicas, entre os empregados, para prevenção de contágio da COVID-19. Ressalta que estudos recentes indicam que o Coronavírus pode circular por até 4 metros ou, mesmo, distâncias de 8 metros, em razão da nuvem de gotículas que se dispersam por um episódio de tosse ou espirro. Invoca o art. 4º, VIII e parágrafo único, do Decreto Estadual nº 55.154, de 01 de abril de 2020, e o art. 1º, II e III, da Portaria nº 283/2020 da Secretaria Estadual da Saúde. Menciona que os Estados e a União têm competência concorrente para legislar sobre normas em defesa da saúde, nos termos do art. 24 da Constituição Federal. Reitera argumentos acerca do descumprimento, pela litisconsorte, do distanciamento requerido pelo impetrante e fixado na legislação, anexando outras fotografias. Entende que a manutenção de interdição é, portanto, justificada. Em relação ao uso de máscaras, nega que os EPIs fornecidos sejam adequados para evitar o contágio da COVID-19, pois as máscaras de tecidos encontradas pela fiscalização na sede da litisconsorte são "desprovidas de qualquer mínima especificação técnica acerca das características e gramatura do tecido, níveis de eficiência de filtragem, dimensões, vedação, resistência respiratória, e requisitos mínimos de higienização das peças, seriam, pois, suficientes. [...] por serem de tecido não são enquadráveis como EPIs, bem como não atendem sequer minimamente ao previsto na norma ABNT PR 1002:2020 que, em resumo, exige que as máscaras de tecido possuam, no mínimo, camada tripla, sendo uma camada de tecido não impermeável na parte frontal, tecido respirável no meio e um tecido de algodão na parte em contato com a superfície do rosto. Quanto à composição de tecidos, exige características específicas quanto à gramatura2, à capacidade de filtragem3 e à resistência à inspiração, determinando ainda o cumprimento de critérios relativos às alças, ajuste e dimensões, em relação às quais não há qualquer indicação de observância pela empresa demandada. [...] A utilização de máscaras caseiras, inclusive na linha de produção, pode ser facilmente observada a partir das fotos anexadas ao Relatório Técnico do Termo de Interdição". Transcreve parcialmente laudo colacionado na Ação Civil Pública. No tocante ao sistema de ventilação e circulação de ar, aponta que sequer a perita designada pelo Juízo da ação subjacente confirmou a adequação do sistema de ventilação e renovação de ar, por se declarar inabilitada para tal análise. Frisa ser notório que a COVID-19 é transmitida pelo ar, por meio de gotículas respiratórias, razão pela qual é imprescindível que o volume de ar retirado seja, no mínimo, igual à quantidade de ar exalada pelos empregados que atuam nos ambientes, "sem descartar os critérios de vazão mínima de entrada de ar exterior estabelecidos na ABNT NBR 16401". Noticia que a litisconsorte não comunicou os casos suspeitos às autoridades competentes, deixando de cumprir o que determina a Portaria nº 283/2020 da Secretaria Estadual de Saúde, sendo necessária a criação de um protocolo de notificação imediata dos casos suspeitos de Coronavírus, inclusive aos demais Municípios onde residem seus empregados, com intuito de romper a cadeia de transmissão. Aduz que o ato coator não atendeu integralmente às medidas de segurança, relativamente ao ajuste no serviço de transporte da litisconsorte. Advoga que, "Mais uma vez, resta evidente a falta de interesse da empresa JBS em monitorar, auxiliar e tentar reverter o surto de COVID-19 instaurado em sua própria unidade, pois bastaria, a fim de atender à exigência de controle dos assentos, que passasse a numerar as poltronas e a indicar aos trabalhadores os lugares onde devem sentar, à semelhança do que já é feito em todos os ônibus de viagem comercial, ou somente registrar diariamente quais os trabalhadores sentaram nos referidos lugares. Salienta-se que o controle de quem entra no ônibus e de onde cada um senta é um dado fundamental para rastreabilidade dos contactantes com casos suspeitos ou positivados" (grifos no original). Sustenta estar presente o periculum in mora e o fumus boni iuris para a concessão da liminar pleiteada neste mandado de segurança, havendo risco grave e iminente à saúde e à integridade física dos trabalhadores, constatado pela Gerência Regional do Trabalho de Passo Fundo/RS. Transcreve doutrina. Formula a seguinte pretensão: "a) a concessão de medida liminar, inaudita altera parte face à urgência da situação, para que seja suspenso IMEDIATAMENTE o ato atacado no presente mandamus (decisão liminar concedida nos autos do processo nº 0020284-43.2020.5.04.0664), de modo que seja restabelecido o Termo de Interdição nº 4.042.302-6, o qual vincula a retomada das atividades à emissão do Termo de Suspensão da Interdição pela autoridade competente, com a imediata comunicação da referida decisão à empresa, à Gerência Regional do Trabalho de Passo Fundo (União Federal), por intermédio da Advocacia-Geral da União, e ao Juiz da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo" (grifos no original).

Analiso.

Inicialmente, deixo de examinar o agravo regimental interposto pela litisconsorte JBS AVES LTDA. e passo à análise definitiva da pretensão, tendo em vista que a ação mandamental encontra-se devidamente apta a julgamento.

O ato dito coator é o seguinte (ID. 76ff6f9), cujas frações de interesse transcrevo, dada sua extensão:

Vistos, etc.

Apresentada contestação, laudo pericial e respectivas manifestações no processo nº 0020265-43.2020.5.04.0662, bem como manifestação sobre a tutela de urgência no processo nº 0020284-43.2020.5.04.0664, os autos vêm conclusos para análise do pedido de reconsideração apresentado no ID 37bf9cf do processo 0020265-43.2020.5.04.0662, bem como da tutela de urgência requerida na inicial do processo 0020284-43.2020.5.04.0664, haja vista a reunião determinada na forma do artigo 55 do CPC (ID 1ba443e - processo 0020284-43.2020.5.04.0664).

Em termos gerais, em causa o meio ambiente de trabalho seguro, com adoção de medidas de proteção em face do coronavírus, e o exercício / funcionamento de uma atividade considerada essencial, sob um contexto geral de isolamento e distanciamento social.

De início, cumpre sindicar os motivos justificadores da interdição, conforme termo do ID 29920db do processo 0020284-43.2020.5.04.0664, e os pedidos correspondentes da ação civil pública - ACP (0020265-43.2020.5.04.0662).

a) Sistema de transporte

O termo de interdição aponta haver falhas no sistema de transporte, porquanto não há "critério que impeça o trabalhador de ingressar no veículo já estando doente, contrariando o item 3 do Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME", além de que a disposição dos assentos e sua ocupação não respeita a distância mínima de 1,5m entre cada trabalhador, não havendo, por fim, controle de quem ingressa na condução e onde senta, para fins de rastreabilidade"- ID. 29920db - Pág. 13 - 0020284-43.2020.5.04.0664.

Em correspondência, o pedido III, item 27 (ID. dc5ddc8 - Pág. 61 - 0020265- 43.2020.5.04.0662), pretende "assegurar que o transporte seja realizado com, no máximo, 50% da capacidade de passageiros sentados simultaneamente em ônibus fretados, garantindo-se que a circulação ocorra com janelas e/ou alçapão abertos e/ou quando equipado com ar condicionado que o sistema esteja no modo de recirculação de ar, sem prejuízo do fornecimento de máscaras faciais". E 27.1: "Estabelecer protocolo que viabilize a comunicação de algum tipo de sintoma da COVID-19 pelo trabalhador antes do embarque no transporte fornecido pela compromissária, de modo a evitar-se o embarque de pessoa sintomática".

[...]

Igualmente não merece acolhida a justificativa apresentada no relatório do termo de interdição de que as disposições dos assentos e sua ocupação não respeitam a distância mínima entre cada trabalhador. Como se verifica no ID. 7624ace - Pág. 2 e 3 do processo 0020284-43.2020.5.04.0664, houve remoção de um banco de cada fileira, além da instalação de barreira acrílica entre os bancos, em total observância à orientação n. 32 do Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME, que reza: "32. Priorizar medidas para manter uma distância segura entre trabalhadores, realizando o espaçamento dos trabalhadores dentro do veículo de transporte".

Por fim, a alegação de inexistência de controle de quem ingressa na condução e onde senta, para fins de rastreabilidade, se relaciona com o primeiro argumento, qual seja, de que não há "critério que impeça o trabalhador de ingressar no veículo já estando doente, contrariando o item 3 do Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME".

Nesse particular, subsiste o termo de interdição e, por consequência, o pedido III, item 27.1, já que não há observância da recomendação constante do item 3 do referido ofício circular:

[...]

Contudo, nada obstante os esforços da empresa com a central de triagem, há que impedir o embarque de sintomáticos, nos termos da citada orientação ministerial.

Nesse aspecto, mantenho a interdição e, consequentemente, defiro a tutela de urgência requerida no pedido III, item 27.1 da ACP para que seja priorizada a comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, sendo impedido de embarcar aquele que apresentar tais sintomas.

[...] b) Inadequação dos equipamentos para aferição de temperatura corporal

O termo de interdição sustenta que "os equipamentos utilizados para controle da temperatura corporal das pessoas que adentram na empresa não parecem ser os mais adequados, tendo em vista que conforme relato da profissional da Secretaria Estadual de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, Dorvana Ianzer, os mesmos estavam apontando temperaturas muito mais baixas do que a realidade" (grifei), citando exemplos. ID. 29920db - Pág. 7 e 8. Os mesmos argumentos são utilizados no pedido de reconsideração - ID. 37bf9cf - Pág. 7 do processo 0020265-43.2020.5.04.0662.

A empresa refere que a variação de 30 e 32 graus apontada no termo de interdição ocorreu após determinado período de tempo. Explica que se a verificação apontar qualquer resultado inferior a 35,8ºC ou superior a 37,3ºC, o empregado é imediatamente encaminhado para a triagem, a fim de proceder nova verificação e demais averiguações.

Data vênia, não merece prosperar a justificativa de interdição baseada em suposição, sendo imprescindível prova da falha do equipamento, com aferição técnica.

Demais disso, há que considerar a dupla verificação nos resultados atípicos, ventilada pela empresa, o que vai ao encontro da responsabilidade do serviço médico e da própria boa-fé. Aliás, a empresa demonstra no ID acima citado a aquisição dos referidos instrumentos para implementar o protocolo de verificação de temperatura justamente para auxiliar o combate à pandemia. Logo, não é razoável presumir que tais equipamentos têm o propósito de burla.

Por fim, o documento do ID. 5aa1ae6 - Pág. 1 dá conta, por outro lado, de que os termômetros digitais utilizados pela empresa foram devidamente registrados na ANVISA.

Sob esse argumento, portanto, não subsiste a interdição.

c) Apresentação de atestados médicos

O relatório de interdição, ao sustentar falhas nas medidas de prevenção e contenção da pandemia, aduz que "foi verificado que diversos atestados de casos positivos ou suspeitos são entregues pelo próprio trabalhador doente (ou por colegas). Assim, uma pessoa que deveria estar em isolamento acaba adentrando na empresa, compartilhando espaços com os demais trabalhadores, usando veículo fretado pela empresa" - ID. e0664fe - Pág. 11 0020265-43.2020.5.04.0662.

[...]

Além disso, o parecer do médico do trabalho da empresa refere "que foi estruturado central de recebimento on-line de atestados médicos. Como isso será executado: setor de recursos humanos e de saúde, recebera via e-mail ou plataformas digitais (Ex: plataforma de whatsapp) o atestado médico. Disponibilização de canal/número telefônico exclusivo com tal finalidade. Sendo assim, o empregado não precisará se deslocar fisicamente à empresa" (ID. 3bb05be - Pág. 5 - 0020284-43.2020.5.04.0664). Prova disso, o ID 6db1be1 - pag. 2, que informa o número de telefone e whatsapp e o endereço de e-mail.

Quanto ao meio de apresentação dos atestados médicos, a disponibilização da central de recebimento on line (por telefone, whatsapp ou e-mail) retira a fundamentalidade do argumento utilizado pela autoridade do trabalho, pelo que não subsiste a interdição no particular.

Com relação aos pedidos das letras f e m do item 32, como se vê da prova pericial e do documento do ID. 6dabcc6 - Pág. 16 0020284-43.2020.5.04.0664, por exemplo, a empresa reestruturou o sistema de atendimento com a instalação de uma sala de enfermagem / central de triagem num contêiner isolado da estrutura principal, cujos atendimentos são realizados antes do ingresso na unidade, pelo que restam indeferidos tais pedidos.

De registrar que a generalidade das pretensões, v.g., "instituir procedimento", prejudica a compreensão do seu alcance, assim como o contraditório e ampla defesa, sendo que a questão será melhor avaliada na tutela de fundo.

[...] d) Distanciamento

O termo de interdição assevera haver falhas na implementação e controle do distanciamento entre os trabalhadores. Relata que "em vários pontos do refeitório, vestiário e banheiros essa distância também não é respeitada todo o tempo, conforme registro fotográfico abaixo. Inclusive, até 17/04/2020 as zonas de lazer e momentos de chegada e saída dos ônibus ocorriam com grandes aglomerações conforme informações recebidas da vigilância sanitária municipal" - ID. bb9a5a9 - Pág. 6-7 e 11-12, 0020265-43.2020.5.04.0662.

[...]

O Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME, no seu item 10, orienta a "organizar os postos de trabalho de forma que haja um espaçamento de 2 metros entre os trabalhadores, preferencialmente, ou distância de pelo menos 1 metro". Sem qualquer precisão científica, contudo.

Assim, sem olvidar que todo cuidado é pouco, pela análise pericial (supratranscrita) é possível concluir que a empresa cumpre as orientações de distanciamento emanadas do referido ofício circular. E, nesse contexto, é evidente que quanto mais distância melhor. De regra, entretanto, a perícia constata que o distanciamento é superior a 1,5 metro e, nas impossibilidades, restaram instaladas barreiras físicas devidamente higienizadas, removidas e substituídas, constantemente. Em outras palavras, a empresa adota / está adotando todas as formas possíveis e viáveis para reduzir os efeitos deletérios do coronavírus e continuar suas atividades essenciais.

Ademais, resultam verificados os constantes monitoramento e orientação sobre o necessário distanciamento. As fotografias apresentadas com o termo de interdição demonstram a dificuldade que a empresa tem de conscientizar seus empregados da indispensabilidade de se adotar um comportamento seguro. A mesma dificuldade, aliás, e mal comparando, o Estado enfrenta em relação à população em geral, que não segue as orientações de isolamento e distanciamento social, como se não fossem igualmente responsáveis. Todavia, e a exemplo do Estado, a empresa exerce monitoramento e orientação continuamente.

Insubsistente, por conseguinte, a interdição nesse aspecto. Assim, como não procede o pedido III, itens 3, 3.1, 4, 5 e 32, letras d e e da ACP.

e) Máscaras

No que tange às mascaras, o relatório de interdição aduz que: "o uso, sem qualquer tipo de critério, de máscaras dos mais diversos tipos, materiais e estampas, sem absolutamente qualquer controle ou especificação. Alguns dos trabalhadores entrevistados receberam máscaras de uso único há semanas atrás e continuam usando diariamente, contrariando orientação explícita dos fabricantes. Outros, trazem de casa máscaras caseiras, ou seja, podem estar trazendo material contaminado com carga viral de coronavirus para dentro da planta, pois não há qualquer garantia sobre higienização prévia ou troca dessas máscaras. Uso de máscaras sem qualquer critério, controle ou orientação quanto a material, tempo máximo para troca, tipo de tecido, protocolo de higienização ou troca de filtro quando reutilizável, são mais prejudiciais do que benéficas. Da forma como está, além de não haver qualquer garantia de eficácia, podem se tornar focos/fontes de contaminação e passam a falsa sensação de segurança que faz com que trabalhadores e gestores ignorem outros princípios fundamentais de prevenção, por exemplo o distanciamento mínimo entre as pessoas em todos os momentos. A empresa procurou justificar, inclusive documentalmente, o uso desse tipo de máscara com base na redação da Resolução - RDC N. 356, de 23 de março de 2020, expedida pelo Ministério da Saúde. Ocorre que tal normativa é exclusiva para uso em serviços de saúde, de forma excepcional e temporária. Ainda, tal normativa exige o atendimento de diversas normas técnicas para que o equipamento possa ser utilizada com EPI. No caso da JBS AVES, além de não se tratar de empresa de serviço de saúde, não houve qualquer comprovação de atendimento das normas técnicas previstas na referida Resolução. Cumpre asseverar que mesmo que a empresa adquira as máscaras com garantias de fabricação exigidas pela RDC supracitada, as mesmas não são adequadas às atividades desenvolvidas pela empresa JBS AVES. Em suma, a Resolução é exclusiva para atividades de saúde" - ID. bb9a5a9 - Pág. 8 - 0020265-43.2020.5.04.0662.

[...]

Considerando que 100% dos empregados da empresa, bem como os terceirizados, motoristas e visitantes, usam máscaras, sendo ainda monitorado e orientado o uso, cumpre perquirir acerca da sua eficiência, em termos de prevenção de contágio.

Há uma profusão de orientações, instruções, notas técnicas, circulares, portarias, decretos, pareceres e resoluções das mais variadas competências acerca de medidas preventivas e de combate à pandemia coronavírus. Exemplo disso, a Nota técnica n. 23/2020 / SEI / GGALI / DIRE2 / ANVISA - ID. b77adab - Pág. 1 -, Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME - ID. 3b4733b - Pág. 1 - (ambos Ids processo 0020284-43.2020.5.04.0664), a recente Portaria 283 da Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, publicada em edição extra no Diário Oficial - RS, em 29/42020, dentre outras tantas.

Essa abundância de "normativos" gera dúvidas, inseguranças e incertezas quanto às respectivas observâncias.

Tais atos administrativos com efeitos externos - dirigidos ao público - (a abordagem aqui é de forma geral), por óbvio, devem atuar secundum legem. Isto é, não inovam, não criam ou extinguem direitos, não modificam, per si, qualquer dispositivo do ordenamento jurídico em vigor. Como ato administrativo, não têm vida autônoma. Apenas interpretam o texto legal com fins executivos, traçando diretrizes, ministrando instruções, esclarecimentos e orientações.

E nesse contexto, considerando os termos do art. 22, I, da CF (competência da União para legislar sobre matéria trabalhista), sem olvidar a relação e a integração dos diversos ramos do direito, levo em consideração o ato administrativo emanado da Secretaria de Trabalho / Ministério da Economia, especificamente direcionado ao setor de frigoríficos em razão da pandemia da Covid-19, qual seja, o Ofício Circular SEI n. 1162/2020/ME.

O ofício circular supratranscrito, salvo para o atendimento emergencial aos casos suspeitos ou confirmados da Covid-19 (n. 38), não estabelece o tipo de máscara a ser utilizada, sendo que a orientação n. 39 refere o fornecimento de máscaras cirúrgicas, caso haja necessidade.

A par do dissenso sobre as formas de contágio da Covid-19 e do tipo de máscara recomendável, conforme se percebe do parecer técnico apresentado no ID 4b85230, e sem esquecer que se trata de um frigorífico e não de uma unidade hospitalar, a perícia refere (resposta ao quesito 4 acima transcrita) que as máscaras utilizadas (PFF2, para profissionais da saúde, PFF1 para os demais setores, e máscara de tecido, reutilizável, para uso geral - trajeto, por exemplo) são adequadas para a finalidade proposta. Além disso, a resposta ao quesito 6 (acima transcrita) também aponta substituição tempestiva.

Dessa forma, não subsiste a interdição realizada em 24/4/2020, assim como não merece deferimento o pedido III, itens 3 (parte), 4 (parte), 5 (parte), 27 (parte), 31, letra e (parte), 32, letra a, e b, 33.1, letra g (parte).

Especificamente em relação ao pedido III, 32, letra a, conforme orientação n. 39 do mencionado ofício circular, a disponibilização de máscara cirúrgica aos trabalhadores com sintomas de infecções respiratórias ficará a critério do serviço médico da empresa.

Indefiro.

f) Vigilância epidemiológica

O termo / relatório de interdição aponta irregularidades na comunicação e subnotificação dos casos suspeitos para a vigilância epidemiológica e no monitoramento dos trabalhadores afastados. Após informar o aumento dos casos confirmados e suspeitos (ID. bb9a5a9 - Pág. 4), aduz que:

as práticas de vigilância epidemiológica ativa (busca ativa própria por novos casos suspeitos) da empresa é virtualmente inexistente e a vigilância epidemiológica passiva (acompanhamento de casos informados por terceiros) é falha. Foram identificadas situações incompatíveis para uma empresa com o porte da JBS AVES que já conta com mais de uma dezena de trabalhadores com resultado positivo para COVID-19 e óbito de duas pessoas contactantes de seus funcionários por COVID-19. Por exemplo, trabalhador com diversos sintomas característicos de COVID-19 sendo diagnosticado apenas por exame clínico como um caso de quadro de resfriado comum, sendo enviado imediatamente de volta ao trabalho com medicamentos apenas para atenuar os sintomas.

Entende-se que uma indústria de alimentos não deve manter trabalhador com doença infecciosa em atividade, ainda que seja uma gripe ou resfriado comum. Durante ocorrência de pandemia de COVID-19, sendo constatado casos confirmados de COVID-19 na empresa, tal conduta se torna ainda mais inaceitável (Exemplo 1 do anexo II). Outro exemplo (Exemplo 2 do anexo II), trabalhadora afastada por 14 dias por suspeita de COVID-19 no dia 02/04/2020 e seu cônjuge, que inclusive apresentava sintoma compatível com COVID-19 (dor de garganta), não foi afastado e seguiu trabalhando normalmente, inclusive se utilizando do ônibus da empresa para deslocamento. Ressalta-se que no dia seguinte ao afastamento da esposa, também funcionária da JBS AVES, o mesmo passou pela triagem médica mas não se apresentou quando chamado pelo médico. Nada foi feito após este registro e o trabalhador não foi afastado ou sequer examinado por um médico.

Terceiro exemplo (Exemplo 3 do anexo II), trabalhadora com quatro sintomas compatíveis com COVID-19 segundo ficha de triagem, que foi diagnosticada apenas com exame clínico como tem do um quadro de cefaleia tensional. A mesma foi enviada imediatamente de volta ao trabalho e nenhuma medida de isolamento e identificação de contactantes foi realizada. Hoje essa trabalhadora consta como caso suspeito de COVID-19 pela vigilância de saúde municipal de Ibirapuitã, porém não foi afastada imediatamente e nem sequer se buscou seus contactantes. Desta forma, existe alta probabilidade de que a mesma possa ter contaminado outras pessoas nesse meio tempo, caso se confirme que se trata de caso positivo. Os casos que envolvem questões pessoais de saúde, triagem e prontuário de paciente que foram ou serão mencionados no presente relatório, estarão detalhados no anexo II, inclusive com fotografias dos documentos relevantes, visto que se tratam de informações confidenciais. Os casos supracitados são apenas exemplos, sendo que muitos outros semelhantes poderiam ilustrar a ineficiência da vigilância epidemiológica implementada pela empresa.

Percebe-se que a situação fugiu completamente do controle da empresa, que até o início da ação fiscal (22/04/2020) não realizava qualquer esforço real para identificar casos suspeitos e contactantes dos casos suspeitos ou confirmados. Após início da ação fiscal, adotaram o processo de acompanhamento via ligação telefônica para casos confirmados e suspeitos afastados. Porém, essa medida de forma isolada não é suficiente. Ressalta-se que a legislação municipal e estadual estabelecem afastamento obrigatório imediato, por no mínimo 14 dias, não somente para casos positivos ou suspeitos, mas até para contactantes de casos suspeitos. Da análise da documentação e inquirição do médico da empresa, a empresa não está afastando todos os casos com sintomas suspeitos e seus contactantes, conforme será demonstrado a seguir. Por exemplo, não foi identificado nem um único trabalhador que teve contato (que tenha chegado a menos de 1,50 metros de distância) nos últimos 14 dias da data da avaliação de alguns casos suspeitos. Ora, isso é completamente impossível, posto que várias dessas pessoas trabalham em setores com maior concentração de trabalhadores (por exemplo desossa - Exemplo 3 do Anexo II), com outros trabalhadores em postos laterais e frequentemente outro trabalhador na frente; viajam em ônibus da empresa, onde no mínimo o colega do banco da frente e o de trás ficam mais próximos do que essa distância de 1,50m. Ademais, em vários pontos do refeitório, vestiário e banheiros essa distância também não é respeitada todo o tempo, conforme registro fotográfico abaixo. Inclusive, até 17/04/2020 as zonas de lazer e momentos de chegada e saída dos ônibus ocorriam com grandes aglomerações conforme informações recebidas da vigilância sanitária municipal. Exemplo 4 do anexo II. A empresa tem um controle precário dos casos confirmados, por exemplo em resposta à notificação da Inspeção do Trabalho sobre número de casos suspeitos e confirmados, apresentou tabelas incompletas, inclusive sem incluir casos de trabalhadores dentre os primeiros a serem confirmados que de fato estavam com COVID-19"? - ID. bb9a5a9 - Pág. 4 e 5 - 0020265-43.2020.5.04.0662.

A questão tem pertinência com a segunda parte do pedido I, da ACP, em que se pretende o afastamento, "pelo período mínimo de 14 dias, com vistas à identificação de casos confirmados, ciência do grupo de trabalhadores atingidos e melhor definição de estratégias de isolamentos de maneira a conter o surto instalado, devido ao risco epidemiológico detectado e absoluta ineficiência e falta de caráter técnico-científico nas medidas até então adotadas pela empresa" (de registrar, consoante manifestação do ID 37bf9cf - pág. 13 - 0020265-43.2020.5.04.0662 - resta prejudicada a mesma pretensão constante do pedido II), e com o pedido III, itens 1, 9, 9.1, 9.2, 10, 10.1, 11, 12, 32, letras g, h e i, 34 e 41 - ID. dc5ddc8 - 0020265-43.2020.5.04.0662 [...]

Sem embargo da generalidade das pretensões, que dificulta sobremaneira a correta compreensão dos seus respectivos alcances, assim como o contraditório e a ampla defesa, considerando que a empresa já observa os protocolos médicos e sanitários, além de estar em constante aprimoramento nesta questão, como está, aliás, em contínuo aprendizado acerca da Covid-19, toda a comunidade médico-científica e autoridades do planeta, não procedem os pedidos acima especificados.

No tocante ao pedido III, item 10, cabe ressaltar que, fora dos limites da empresa, compete à autoridade pública de saúde adotar as medidas de isolamento durante o período de contágio.

Especificamente em relação ao pedido 11, para além do já decidido no ID f78d02d acerca dos testes, cumpre acrescer, consoante apontado na Correição Parcial n. 1000309-81.2020.5.00.0000 - ID. ef4aa17 - 0020265-43.2020.5.04.0662, a observância da normativa do Ministério da Saúde, para população que julgar adequada, diante da escassez do insumo, pelo que igualmente é improcedente.

Nada obstante, resta perquirir se os casos positivados e suspeitos dos empregados da empresa justificam sua interdição, e, por conseguinte, o acolhimento da segunda parte do pedido I da ACP (afastamento de 14 dias de todos os empregados).

A análise, contudo, considerando a presente fase processual, restringe-se à recomendação do Ministério da Saúde de afastamento do trabalhador com suspeita de síndrome gripal ou de trabalhador assintomático contactante de paciente suspeito ou confirmado de síndrome gripal, de acordo com o BE-covid n. 08 (ID. 860b80a), conforme já ventilado na decisão do ID f78d02d - 0020265-43.2020.5.04.0662.

O relatório Epidemiológico da Secretaria de Saúde do Município de Passo Fundo, de 22/4/2020 (ID. 0233b9b e ID. 0233B9b - 0020265-43.2020.5.04.0662), aponta o incremento do número de casos positivados e suspeitos de Covid-19 em empregados da JBS a ponto de considerar caso de surto. Embora não tenha sido demonstrado cabalmente o nexo causal entre o contágio e o trabalho na empresa, certo é que a transmissão já é considerada comunitária. Assim, não sendo possível identificar os contactantes, de acordo com a orientação do Ministério da Saúde acima referida, se mostra prudente o afastamento por 14 dias, tendo em vista o período de incubação.

Segundo a OMS, "o período de incubação é o tempo entre ser infectado pelo vírus e o início dos sintomas da doença. As estimativas atuais do período de incubação variam de 1 a 14 dias, mais frequentemente ao redor de cinco dias. Essas estimativas estão sendo atualizados à medida que mais dados se tornam disponíveis" - https://www.paho.org/bra/index.php option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875 - consulta em 2/5/2020.

Defiro, consequentemente, a tutela de urgência requerida na ACP para determinar o afastamento de todos os empregados da ré pelo período de 14 dias, contatos da interdição ocorrida em 24/4/2020. Corolário, concedo em parte a tutela de urgência pleiteada pela empresa para limitar, neste particular, a interdição ao período de 14 dias, contados de 24/4 /2020.

Demais disso, a exigência de realização de testes em todos os empregados antes do retorno ao trabalho desde já é indeferida nos termos da decisão do ID f78d02d - 0020265-43.2020.5.04.0662, lembrando ainda, conforme referido alhures, a necessidade de respeitar a normativa do Ministério da Saúde, que diante da escassez atual desse tipo de exame, decide em qual parte da população aplicará os testes.

g) Sistema de ventilação [...]

A interdição não encontra respaldo fático ou, ao menos, não apresenta qualquer prova técnica de que o sistema de ventilação de ar, nas diversas áreas da empresa, não era ou deixou de ser adequado. Não há qualquer medição / avaliação técnica indicando como, onde e por que não está adequado.

Para o efeito de interdição, há a necessidade de indicar clara e precisamente a irregularidade.

Destarte, por carecer de suporte fático, a interdição no aspecto não subsiste.

A recíproca é verdadeira, no tocante aos pedidos relacionados na ACP. A probabilidade fática, consistente na verificação de que os elementos trazidos ocorreram ou estão ocorrendo na forma alegada, conforme já ventilado alhures, não se faz presente, sendo imperiosa a dilação probatória, motivo pelo que indefiro a tutela de urgência pleiteada.

A empresa ré deverá apresentar os laudos descritos no anexo da Resolução-RE, n. 09, de 16/1/2003 - Ministério da Saúde - ANVISA, com assinatura do responsável técnico, no prazo de 20 dias.

Fixados esses pontos, passo à análise das pretensões remanescentes do pedido III do processo 0020265-43.2020.5.04.0662, em sede de tutela de urgência.

h) Medidas preventivas [...]

Para além da generalidade das medidas pretendidas e do já referido nas letras d e f acima, no que se relaciona aos itens 2 e 2.1, o conjunto probatório demonstra que a empresa ré tem adotado e aperfeiçoado medidas preventivas de combate à pandemia, não se encontrando presente a probabilidade fática para autorizar a tutela de urgência.

Ainda no tocante aos itens 2.1, 8 e 8.1, perfilho do entendimento consubstanciado na decisão do ID 5a89c83 de que a programação do abate e eventual concessão de incentivos para que os empregados atendam o chamado ao trabalho se enquadra em atos de gestão, não caracterizando, per si, abuso de direito ou qualquer ilegalidade.

Indefiro.

i) Medidas preventivas - terceiros [...]

Como é possível perceber, a ré tem adotado e aperfeiçoado medidas preventivas de combate à pandemia, independentemente de qualquer determinação judicial, restando improcedente o pedido de tutela de urgência.

j) Medidas preventivas - compartilhamento de objetos [...]

No que diz respeito às áreas de vivência, as imagens dos IDs 1506808 - Pág. 17- 8, c0791b8 - Pág. 9 e 75e9c5d - Pág. 36-7 evidenciam a alteração na sistemática de funcionamento dos refeitórios, a fim de evitar o compartilhamento de objetos e intensificar a sua higienização.

Já com relação aos armários, a perita nomeada pelo juízo identifica a existência de um para cada trabalhador e a ampliação dos vestiários (ID c0ac5a8 - Pág. 58 - item 7).

Não bastasse, as medidas pretendidas atinentes à eliminação de bebedouros, lixeiras, secadores de mãos, toalhas e dispenseres do refeitório não estão calcadas em nenhum normativo vigente acerca da prevenção da pandemia do vírus Covid-19, motivo porque indefiro a tutela de urgência.

Mais uma vez, o conjunto probatório demonstra que a empresa ré tem adotado e aperfeiçoado as medidas preventivas de combate à pandemia, sendo prescindível qualquer pronunciamento jurisdicional a respeito.

k) Medidas preventivas - higienização e sanitização de ambientes [...]

Da mesma forma, as fotografias anexadas ao laudo pericial (ID 72d9313 - Pág. 25; ID c0ac5a8 - Pág. 14-5) apontam a desinfecção das áreas externas da ré.

A ré também comprova a disponibilização de pias com água e sabão (ID 75e9c5d - Pág. 31) e o distanciamento de 1,5 metro e 2,2 metros entre elas (IDs a5de3e1 - Pág. 4, 1506808 - Pág. 13 e 28).

Em resumo, demonstrado que a empresa ré tem adotado e aperfeiçoado as medidas preventivas de combate à pandemia, prescindível qualquer pronunciamento jurisdicional a respeito.

Rejeito.

l) Medidas preventivas - vacinas

No item 17 do pedido III, o Ministério Público do Trabalho pretende:

"Disponibilizar vacina trivalente que proteja contra o vírus Influenza A (H1N1), A (H3N2) e B de forma gratuita a todos os empregados, com vistas a melhor identificação dos casos sintomáticos de COVID-19".

A perícia constata que "a empresa já possui contrato com o SESI, para vacinar 100% dos funcionários, gratuitamente, com a vacina trivalente. A data prevista para tal, é dia 29.04.2020" (ID c0ac5a8 - Pág. 63).

Ainda que assim não fosse, trago à lembrança que a vacina contra a gripe não confere proteção contra nenhuma cepa de Covid-19, sendo que o Sistema Único de Saúde garante vacinação gratuita para toda a população pertencente a qualquer grupo de risco.

Ausente a probabilidade fática autorizadora da tutela de urgência, indefiro.

m) Medidas preventivas - ônibus

A perícia constata que, desde 23/3/2020, a ré disponibiliza álcool em gel em toda frota de ônibus para uso dos motoristas e funcionários (ID 72d9313 - Pág. 6).

Além disso, em resposta ao quesito 26 do juízo - "Os ônibus são higienizados? Qual a frequência?", a perita relata que:

Os ônibus são higienizados diariamente, interna e externamente, na garagem da concessionária.

E, junto ao pátio da empresa Ré, são sanitizados através de pulverização com álcool a 70º, no intervalo de troca de passageiros. Para tal, foi contratada empresa especializada, que encontra-se diariamente no local, para proceder a essa sanitização" (ID c0ac5a8 - Pág. 62).

Também afirma que há álcool em gel 70% disponível em todos os veículos de transporte da ré (quesito do juízo 27 - ID c0ac5a8 - Pág. 62).

A ré confirma, por meio das fotografias dos IDs 1506808 - Pág. 6-7 e 75e9cd - Pág. 15 a higienização e sanitização dos ônibus que transportam os trabalhadores, assim como a obrigatoriedade do uso de máscaras e da aplicação de álcool 70% nas mãos ao entrar nos veículos, tornando prescindível qualquer pronunciamento jurisdicional a respeito.

n) Medidas preventivas - adicionais [...]

Mais uma vez, nada obstante os contornos genéricos e pouco precisos das pretensões, como por exemplo, "monitorar o estoque disponível de equipamentos de proteção individual", da análise perfunctória, especialmente, da perícia de verificação, já transcrita, praticamente na sua totalidade, é possível perceber que a ré adota e aprimora uma série de medidas emergenciais de combate à pandemia do coronavírus, inclusive em relação às medidas requeridas, restando, consequentemente, ausente a probabilidade fática autorizadora da tutela de urgência.

Indefiro.

o) Medidas preventivas - pausas

No pedido III, item 33.1, letras a e b, o MPT pleiteia a concessão de pausas psicofisiológicas e térmicas em "ambientes externos arejados ou em salas e ambientes não artificialmente refrigerados, de forma a evitar a presença de aglomeração de trabalhadores em ambientes com baixa taxa de renovação de ar", ou "em salas ou corredores que possuam exaustão forçada ou alimentação direta de ar externo, quando não for possível o atendimento do item anterior".

Não há qualquer demonstração de que a ré desrespeite as pausas para recuperação térmica (art. 253 da CLT) ou decorrentes da NR 36. Aliás, é de conhecimento do juízo, num sem número de ações individuais já julgadas, que a ré concede, além do intervalo para repouso e alimentação, de recuperação térmica, três pausas de 20 minutos em cada jornada (vide, por exemplo ata da audiência de instrução processo 0020434-64.2019.5.04.0662).

Não sendo demonstrado, ainda, que o local de gozo seja inadequado.

Não merecem acolhida as pretensões.

p) Medidas preventivas - flexibilidade de jornada [...]

As medidas exigidas pelo Ministério Público Trabalho nesses itens mostram-se demasiadamente genéricas, além de atentar contra o poder de gestão da empresa.

Saliento que da análise perfunctória é possível perceber que, administrativamente, a ré adota (num processo contínuo de aprimoramento) inúmeras medidas de prevenção e combate à pandemia num esforço de conciliar o meio ambiente de trabalho seguro e a necessidade de manter o exercício de sua atividade, considerada essencial.

Não resulta demonstrado, no particular, qualquer descumprimento legal, não havendo necessidade de prévio comando judicial.

Indefiro.

Pelo exposto, em sede de tutela de urgência, julgo insubsistente a interdição, exceto: a) no que tange à necessidade de comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, devendo ser impedido de ingressar na condução aquele que apresentar tais sintomas; e b) em vista do possível contágio comunitário, conforme relatório Epidemiológico da Secretaria de Saúde do Município de Passo Fundo, de 22/4/2020, limitada, neste aspecto, ao período de incubação de 14 dias, contados de 24/4/2020. No particular, afasto a exigência de realização de testes em todos os empregados antes do retorno ao trabalho, nos termos da decisão do ID f78d02d - 0020265-43.2020.5.04.0662, ressaltando, também, a necessidade de respeitar a normativa do Ministério da Saúde, que diante da escassez do insumo, deve decidir em qual parte da população aplicará os testes.

Defiro, por outro lado, a tutela de urgência requerida no pedido III, item 27.1 da ACP para que seja priorizada a comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, devendo ser impedido de embarcar aquele que apresentar tais sintomas; bem como a segunda parte do pedido I, qual seja, o afastamento de todos os empregados da ré pelo período de 14 dias, contatos da interdição ocorrida em 24/4/2020.

Por fim, a empresa ré, deverá apresentar os laudos descritos no anexo da Resolução-RE, n. 09, de 16/1/2003 - Ministério da Saúde - ANVISA, com assinatura do responsável técnico, no prazo de 20 dias. Após, venham conclusos para análise da necessidade de verificação técnica a respeito, na forma dos artigos 765 da CLT e 156 do CPC.

Desta decisão, serão intimados: a) a empresa ré o sindicato pelo Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho; b) a União Federal, via sistema.

PASSO FUNDO/RS, 04 de maio de 2020.

LUCIANO RICARDO CEMBRANEL

Juiz do Trabalho Titular

O pedido liminar do mandado de segurança foi deferido nos seguintes termos (ID. 31479f6):

Pelo exposto, reputo presentes os requisitos do art. 7º, III, da Lei 12.016/09 e DEFIRO A LIMINAR REQUERIDA para cassar em parte a liminar proferida na ação subjacente nº 0020284- 43.2020.5.04.0664, que tramita perante a 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS, restabelecendo o Termo de Interdição nº 4.042.302-6, até que a litisconsorte comprove o atendimento rigoroso e integral do mesmo, sob pena de multa de R$ 10.000,00, por dia e por empregado, sem prejuízo de outras medidas que visem dar efetividade a presente decisão, em caso de funcionamento da sede do Município de Passo Fundo/RS, sem cumprir as exigências do Auto de Interdição.

Conforme referi na decisão liminar, a prova pré-constituída confere verossimilhança às alegações do impetrante.

a) Legislação aplicável

Inicialmente, importante destacar recente decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.341, que "referendou a medida cautelar deferida pelo Ministro Marco Aurélio (Relator), acrescida de interpretação conforme à Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei nº 13.979, a fim de explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais, vencidos, neste ponto, o Ministro Relator e o Ministro Dias Toffoli (Presidente), e, em parte, quanto à interpretação conforme à letra b do inciso VI do art. 3º, os Ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux."

A medida cautelar foi proferida nos seguintes termos:

[...]

A cabeça do artigo 3º sinaliza, a mais não poder, a quadra vivenciada, ao referir-se ao enfrentamento da emergência de saúde pública, de importância internacional, decorrente do coronavírus. Mais do que isso, revela o endosso a atos de autoridades, no âmbito das respectivas competências, visando o isolamento, a quarentena, a restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por rodovias, portos ou aeroportos de entrada e saída do País, bem como locomoção interestadual e intermunicipal.

Seguem-se os dispositivos impugnados. O § 8º versa a preservação do exercício e funcionamento dos serviços públicos e atividades essenciais. O § 9º atribui ao Presidente da República, mediante decreto, a definição dos serviços e atividades enquadráveis. Já o § 10 prevê que somente poderão ser adotadas as medidas em ato específico, em articulação prévia com o órgão regulador ou o poder concedente ou autorizador. Por último, o § 11 veda restrição à circulação de trabalhadores que possa afetar o funcionamento de serviços púbicos e atividades essenciais.

Vê-se que a medida provisória, ante quadro revelador de urgência e necessidade de disciplina, foi editada com a finalidade de mitigar-se a crise internacional que chegou ao Brasil, muito embora no território brasileiro ainda esteja, segundo alguns técnicos, embrionária. Há de ter-se a visão voltada ao coletivo, ou seja, à saúde pública, mostrando-se interessados todos os cidadãos. O artigo 3º, cabeça, remete às atribuições, das autoridades, quanto às medidas a serem implementadas. Não se pode ver transgressão a preceito da Constituição Federal. As providências não afastam atos a serem praticados por Estado, o Distrito Federal e Município considerada a competência concorrente na forma do artigo 23, inciso II, da Lei Maior.

Também não vinga o articulado quanto à reserva de lei complementar. Descabe a óptica no sentido de o tema somente poder ser objeto de abordagem e disciplina mediante lei de envergadura maior. Presentes urgência e necessidade de ter-se disciplina geral de abrangência nacional, há de concluir-se que, a tempo e modo, atuou o Presidente da República - Jair Bolsonaro - ao editar a Medida Provisória. O que nela se contém - repita-se à exaustão - não afasta a competência concorrente, em termos de saúde, dos Estados e Municípios. Surge acolhível o que pretendido, sob o ângulo acautelador, no item a.2 da peça inicial, assentando-se, no campo, há de ser reconhecido, simplesmente formal, que a disciplina decorrente da Medida Provisória nº 926/2020, no que imprimiu nova redação ao artigo 3º da Lei federal nº 9.868/1999, não afasta a tomada de providências normativas e administrativas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

3. Defiro, em parte, a medida acauteladora, para tornar explícita, no campo pedagógico e na dicção do Supremo, a competência concorrente. (grifei).

Observo que, de acordo com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, não há dúvida de que há competência concorrente da União, Estados e Municípios para legislar sobre matéria relacionada à saúde.

Partindo dessa premissa, entendo válidas e aplicáveis as normas editadas em âmbito estadual e municipal, nos termos que seguem.

A Lei nº 13.979/2020 dispõe sobre "as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019."

Em âmbito estadual, foi editado o Decreto nº 55.154, de 01 de abril de 2020, reiterando "o estado de calamidade pública em todo o território do Estado do Rio Grande do Sul para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus) declarado por meio do Decreto nº 55.128, de 19 de março de 2020, e reconhecido pela Assembleia Legislativa por meio do Decreto Legislativo nº 11.220, de 19 de março de 2020."

Transcrevo parcialmente o teor do referido Decreto Estadual, nas frações de interesse:

[...]

Art. 2º As autoridades públicas, os servidores e os cidadãos deverão adotar todas as medidas e providências necessárias para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), observado o disposto neste Decreto.

Parágrafo único. São medidas sanitárias, de adoção obrigatória por todos, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), dentre outras:

I - a observância do distanciamento social, restringindo a circulação, as visitas e as reuniões presenciais de qualquer tipo ao estritamente necessário;

II - a observância de cuidados pessoais, sobretudo da lavagem das mãos, antes e após a realização de quaisquer tarefas, com a utilização de produtos assépticos, como sabão ou álcool em gel setenta por cento, bem como da higienização, com produtos adequados, dos instrumentos domésticos e de trabalho;

III - a observância de etiqueta respiratória, cobrindo a boca com o antebraço ou lenço descartável ao tossir ou espirrar.

CAPÍTULO I

DAS MEDIDAS EMERGENCIAIS

Art. 3º Ficam determinadas, diante das evidências científicas e análises sobre as informações estratégicas em saúde, limitadamente ao indispensável à promoção e à preservação da saúde pública, com fundamento no art. 3º da Lei Federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), em todo o território do Estado do Rio Grande do Sul, as medidas de que trata este Decreto.

[...]

Art. 37. Os Municípios do Estado do Rio Grande do Sul, no âmbito de suas competências, deverão adotar as medidas necessárias para a prevenção e o enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), em especial:

I - determinar a fiscalização, pelos órgãos municipais responsáveis, acerca do cumprimento das proibições e das determinações estabelecidas neste Decreto;

(grifei).

De acordo com as legislações acima referidas, não há dúvida de que deveriam ser adotadas todas as medidas de cautela para redução da transmissibilidade do novo Coronavírus.

Por outro lado, além das normas vigentes e das acima transcritas, vem sendo amplamente divulgado o alto grau de contágio do novo Coronavírus entre a população mundial, predominando, até o momento, os casos mais severos e com maior índice de letalidade entre indivíduos com 60 anos ou mais de idade e portadores de doenças crônicas, tais como: cardiopatas, diabéticos, hipertensos e imunodeprimidos, pessoas que possuem problemas respiratórios, renais, se submeteram à cirurgia bariátrica e gestantes.

Outra importante recomendação do Ministério da Saúde é de que, havendo suspeita ou confirmada contaminação de um membro familiar dentro do ambiente doméstico, que não necessite de internação, ele fique isolado e tenha todos os seus objetos (incluindo pratos, copos e talheres utilizados) separados dos demais utensílios usados pelo restante dos moradores.

Friso, ainda, que, até o momento, a aplicação de testes para detecção de Coronavírus não está sendo realizada de forma ampla, de modo que não é possível saber se mesmo as pessoas assintomáticas estão infectadas ou não pelo COVID-19, considerando-se que, em muitos casos, a doença permanece assintomática.

Assim, não por acaso, no dia 10/05/2020, foi publicado o Decreto Estadual nº 55.240/2020, que "Institui o Sistema de Distanciamento Controlado para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo novo Coronavírus (COVID-19) no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, reitera a declaração de estado de calamidade pública em todo o território estadual e dá outras providências.", evidenciando que permanecia sendo necessária a adoção de medidas para conter e enfrentar a epidemia do novo Coronavírus e disciplinando:

[...]

Art. 9º As autoridades públicas deverão e os cidadãos poderão exigir o cumprimento das medidas e providências necessárias para a prevenção e o enfrentamento à epidemia de COVID-19, observado o disposto neste Decreto.

Art. 10 Ficam determinadas, diante das evidências científicas e análises sobre as informações estratégicas em saúde, com fundamento no art. 3º da Lei Federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, em todo o território do Estado do Rio Grande do Sul, as medidas de prevenção e de enfrentamento à epidemia de COVID-19 definidas neste Decreto, de aplicação obrigatória, observadas a graduação, proporcionalidade e segmentação nele estabelecidas.

Art. 11 As medidas de prevenção e de enfrentamento à epidemia de COVID-19 definidas neste Decreto classificam-se em:

I - permanentes: de aplicação obrigatória em todo o território estadual independentemente da Bandeira Final aplicável à Região;

II - segmentadas: de aplicação obrigatória nas Regiões, conforme a respectiva Bandeira Final, com intensidades e amplitudes variáveis, definidas em Protocolos específicos para cada setor.

Parágrafo único. Sempre que necessário, diante de evidências científicas ou análises sobre as informações estratégicas em saúde, poderá o Governador estabelecer medidas extraordinárias para fins de prevenção ou enfrentamento à epidemia de COVID-19, bem como alterar o período e o âmbito de abrangência das medidas estabelecidas neste Decreto.

Art. 12 São medidas sanitárias permanentes, de adoção obrigatória por todos, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia de COVID-19, dentre outras:

I - a observância do distanciamento social, restringindo a circulação, as visitas e as reuniões presenciais de qualquer tipo ao estritamente necessário;

II - a observância de cuidados pessoais, sobretudo da lavagem das mãos, antes e após a realização de quaisquer tarefas, com a utilização de produtos assépticos, como sabão ou álcool em gel setenta por cento, bem como da higienização, com produtos adequados, dos instrumentos domésticos e de trabalho;

III - a observância de etiqueta respiratória, cobrindo a boca com o antebraço ou lenço descartável ao tossir ou espirrar;

IV - a observância do distanciamento interpessoal mínimo de dois metros, evitando-se a formação de aglomerações de pessoas nos recintos ou nas áreas internas e externas de circulação ou de espera, bem como nas calçadas, portarias e entradas dos prédios e estabelecimentos, públicos ou privados.

Subseção I

Das medidas sanitárias permanentes nos estabelecimentos

Art. 13 São de cumprimento obrigatório, em todo o território estadual, independentemente da Bandeira Final de cada Região, por todo e qualquer estabelecimento destinado a utilização simultânea por várias pessoas, de natureza pública ou privada, comercial ou industrial, fechado ou aberto, com atendimento a público amplo ou restrito, devendo o responsável cumpri-las e, quando for o caso, exigir o seu cumprimento pelos empregados, clientes ou usuários, as seguintes medidas permanentes de prevenção à epidemia de COVID-19:

I - determinar a utilização de máscara facial pelos empregados e exigir a sua utilização por clientes e usuários, para ingresso e permanência no interior do recinto;

II - higienizar, após cada uso, durante o período de funcionamento e sempre quando do início das atividades, as superfícies de toque (mesas, equipamentos, cardápios, teclados, etc.), preferencialmente com álcool em gel setenta por cento ou outro produto adequado;

III - higienizar, preferencialmente após cada utilização ou, no mínimo, a cada três horas, durante o período de funcionamento e sempre quando do início das atividades, os pisos, as paredes, os forro e o banheiro, preferencialmente com água sanitária ou outro produto adequado;

IV - manter à disposição, na entrada no estabelecimento e em local de fácil acesso, álcool em gel setenta por cento, para a utilização dos clientes e dos funcionários do local;

V - manter locais de circulação e áreas comuns com os sistemas de ar condicionados limpos (filtros e dutos) e, obrigatoriamente, manter pelo menos uma janela externa aberta ou qualquer outra abertura, contribuindo para a renovação de ar;

VI - manter disponível "kit" completo de higiene de mãos nos sanitários de clientes, usuários e funcionários, utilizando sabonete líquido, álcool em gel setenta por cento e toalhas de papel não reciclado;

VII - manter louças e talheres higienizados e devidamente individualizados de forma a evitar a contaminação cruzada;

VIII - adotar sistemas de escalas, de revezamento de turnos e de alterações de jornadas, para reduzir fluxos, contatos e aglomerações de seus funcionários;

IX - diminuir o número de mesas ou estações de trabalho ocupadas no estabelecimento de forma a aumentar a separação entre elas, diminuindo o número de pessoas no local e garantindo o distanciamento interpessoal de, no mínimo, dois metros;

X - fazer a utilização, se necessário, do uso de senhas ou outro sistema eficaz para evitar filas ou aglomeração de pessoas;

XI - dispor de protetor salivar eficiente nos serviços ou refeitórios com sistema de "buffet";

XII - manter fixado, em local visível aos clientes e funcionários, de informações sanitárias sobre higienização e cuidados para a prevenção à COVID-19;

XIII - instruir seus empregados acerca da obrigatoriedade da adoção de cuidados pessoais, sobretudo da lavagem das mãos ao fim de cada turno, da utilização de produtos assépticos durante o desempenho de suas tarefas, como álcool em gel setenta por cento, da manutenção da limpeza dos instrumentos de trabalho, bem como do modo correto de relacionamento com o público no período de emergência de saúde pública decorrente da COVID-19;

XIV - afastar, imediatamente, em quarentena, pelo prazo mínimo de quatorze dias, das atividades em que haja contato com outros funcionários ou com o público todos os empregados que apresentem sintomas de contaminação pela COVID-19, conforme o disposto no art. 45 deste Decreto, assim bem como aqueles que tenham contato ou convívio direto com caso suspeito ou confirmado.

Parágrafo único. O distanciamento interpessoal mínimo de dois metros de que trata o inciso IX deste artigo pode ser reduzido para o mínimo de um metro no caso de utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPIs adequados para evitar contaminação e transmissão do novo Coronavírus.

[...]

Art. 15 Fica determinado o uso obrigatório de máscara de proteção facial sempre que se estiver em recinto coletivo, compreendido como local destinado a permanente utilização simultânea por várias pessoas, fechado ou aberto, privado ou público, bem como nas suas áreas de circulação, nas vias públicas e nos meios de transporte.

[...]

Art. 19 As medidas sanitárias segmentadas, destinadas a prevenir e a enfrentar a evolução da epidemia de COVID-19, respeitando o equilíbrio entre o necessário para a promoção da saúde pública e a manutenção do desempenho das atividades econômicas, são definidas em Protocolos específicos, fixados pela Secretaria Estadual da Saúde, conforme o setor ou grupos de setores econômicos, e têm aplicação cogente no âmbito de todos os Municípios inseridos em cada Região de que trata o § 2º do art. 8º deste Decreto, fixados em diferentes graus de restrição, conforme a Bandeira Final em que classificada a Região, de acordo com o sistema de monitoramento de que tratam os artigos 4º e 5º deste Decreto.

Art. 20 As medidas sanitárias segmentadas são de aplicação cumulativa com aquelas definidas neste Decreto como medidas sanitárias permanentes, bem como com aquelas fixadas nas Portarias da Secretaria Estadual da Saúde e com as normas municipais vigentes.

Art. 21 Os Protocolos que definirem as medidas sanitárias segmentadas poderão estabelecer, dentre outros critérios de funcionamento para os estabelecimentos, públicos ou privados, comerciais ou industriais:

I - teto de operação, compreendido como o percentual máximo de pessoas, trabalhadores ou não, que podem estar presentes, ao mesmo tempo, em um mesmo ambiente de trabalho, fixado a partir do limite máximo de pessoas por espaço físico livre, conforme estabelecido no teto de ocupação;

II - modo de operação;

III - horário de funcionamento;

IV - restrições específicas por atividades;

V - obrigatoriedade de monitoramento de temperatura; e

VI - obrigatoriedade de testagem dos trabalhadores.

[...]

Art. 23 Os estabelecimentos comerciais ou industriais situados no território do Estado do Rio Grande do Sul somente poderão ter o seu funcionamento ou a sua abertura para atendimento ao público autorizados se atenderem, cumulativamente:

I - as medidas sanitárias permanentes de que trata este Decreto;

II - as medidas sanitárias segmentadas vigentes para a Região em que situado o Município de funcionamento do estabelecimento;

III - as normas específicas estabelecidas nas Portarias da Secretaria Estadual da Saúde;

IV - as respectivas normas municipais vigentes.

[...]

Art. 40 Os Municípios do Estado do Rio Grande do Sul, no âmbito de suas competências, deverão adotar as medidas necessárias para a prevenção e o enfrentamento à epidemia de COVID-19, em especial:

I - determinar a fiscalização, pelos órgãos municipais responsáveis, acerca do cumprimento das proibições e das determinações estabelecidas neste Decreto;

[...]

Art. 48 Constitui crime, nos termos do disposto no art. 268 do Código Penal, infringir determinação do Poder Público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa.

Parágrafo único. As autoridades deverão adotar as providências cabíveis para a punição, cível, administrativa e criminal, bem como para a prisão, em flagrante, quando for o caso, de todos aqueles que descumprirem ou colaborarem para o descumprimento das medidas estabelecidas neste Decreto.

[...]

Art. 50 Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogado o Decreto nº 55.154, de 1º de abril de 2020. (grifei).

De acordo com o novo regramento estadual instituído pelo Decreto nº 55.240/2020, é de adoção obrigatória uma série de medidas rigorosas para que os estabelecimentos comerciais (em sentido amplo) possam manter seu funcionamento, com previsão de punição cível, administrativa e criminal, bem com prisão em flagrante, quando for o caso, de todos aqueles que descumprirem ou colaborarem para o descumprimento das medidas previstas na referida legislação, sem prejuízo de outras medidas que possam ser exigidas pelos Municípios e pela Secretaria Estadual de Saúde.

O cumprimento, portanto, de todas as medidas sanitárias previstas na legislação não é opcional, seja por parte da população, seja por parte das empresas, assim como não é opcional sua fiscalização e a adoção das providências cabíveis pelas autoridades competentes.

Importante referir que, ao empregador, não incumbe apenas implementar todas as medidas necessárias, mas também fiscalizar o cumprimento das mesmas pela totalidade de seus empregados, de modo que a prevenção do contágio torne-se efetiva e atinja a finalidade das normas legais, promovendo a proteção à saúde, à integridade física e emocional e à vida.

No tocante, especificamente, aos frigoríficos, a Secretaria Estadual da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul publicou, no Diário Oficial de 08/06/2020, a Portaria SES nº 407/2020 com o seguinte teor:

[...]

Art. 1º Estabelecer protocolo que deverá ser cumprido pelas indústrias de abate e processamento de carnes e pescados, em todas as suas plantas frigoríficas situadas no Estado do Rio Grande do Sul, adotando as medidas para prevenção e controle da COVID-19 (novo coronavírus), nos termos desta Portaria.

Art. 2º As indústrias de abate e processamento de carnes e pescados deverão elaborar plano de contingência para prevenção, monitoramento e controle da transmissão da COVID-19, firmado por profissional técnico, que contemple, no mínimo, as seguintes medidas:

I - Implementar o uso de equipamentos provisórios de material liso, resistente e de fácil higienização, com a finalidade de manter o afastamento entre os manipuladores, sem que altere a estrutura física existente e provada, bem como sem comprometer o fluxo de produção. O estabelecimento deverá comunicar previamente ao Serviço Oficial de Inspeção Sanitária da Secretaria de Agricultura, a quantidade e os locais onde esses equipamentos serão instalados, em caráter provisório;

II - identificar, de forma sistemática, os casos suspeitos e realizar constante monitoramento da saúde dos trabalhadores.

Parágrafo único. O plano de contingência deverá ser disponibilizado às autoridades sanitárias estadual ou municipal sempre que requisitado.

Art. 3º As indústrias de abate e processamento de carnes e pescados deverão realizar as seguintes ações como medidas de Vigilância e Busca Ativa:

I - oportunizar a realização de trabalho remoto (teletrabalho) a todos os trabalhadores que possam executar suas atividades desta maneira, sem prejuízo às atividades da empresa, especialmente para os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco, de acordo com os critérios divulgados pelo Ministério da Saúde, e, em não sendo possível, assegurar que as atividades sejam realizadas em ambiente com menor exposição ao risco de contaminação;

II - realizar busca ativa, diária, em todos os turnos de trabalho, em colaboradores, funcionários, terceirizados, prestadores de serviços e visitantes, com sintomas de síndrome gripal (febre, tosse, coriza, dor de garganta e dificuldade respiratória), bem como, também, realizar anamnese dirigida à identificação de contato com casos suspeitos ou confirmados da doença no raio de 1,5 metro e no ambiente domiciliar;

III - estabelecer articulação com a Vigilância em Saúde do Município, com vistas ao repasse de informações dos casos identificados no processo de busca ativa mencionado no inciso anterior;

IV - garantir o imediato afastamento dos trabalhadores sintomáticos de síndrome gripal, até a realização e a divulgação dos resultados de exames específicos, seguindo os protocolos das autoridades sanitárias;

V - permitir que o trabalhador com resultado negativo para COVID-19 retorne às atividades laborais, desde que assintomático há mais de 72 horas e após avaliação clínica;

VI - definir estratégias de testagem de contatos próximos, como forma de identificar casos assintomáticos para afastamento e/ou retorno às atividades, quando ocorrer a identificação de surto de síndrome gripal no frigorífico;

VII - implantar protocolo para comunicação, identificação e afastamento de trabalhadores com sintomas da COVID-19, antes do embarque no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, de maneira a impedir o embarque de pessoas sintomáticas, incluindo eventuais terceirizados da empresa de fretamento;

VIII - garantir que o atendimento ambulatorial de casos de síndrome gripal ou suspeitos de COVID-19 seja realizado em local separado dos demais atendimentos, fornecendo-se máscara cirúrgica a todos os trabalhadores a partir da chegada no ambulatório;

IX - orientar os trabalhadores afastados sobre as medidas de isolamento e os procedimentos a serem seguidos, mantendo o registro atualizado do monitoramento durante o período de afastamento, o qual deverá contemplar, no mínimo, as seguintes informações: nome completo; setor de trabalho; turno de trabalho; data do início dos sintomas; data de afastamento; contactantes domiciliares; data da notificação à Secretaria Municipal de Saúde sede da indústria e; data do retorno ao trabalho;

X - notificar imediatamente os casos suspeitos de síndrome gripal e confirmados de COVID19, bem como todos os casos de afastamento, à Vigilância em Saúde do Município sede da indústria, bem como Coordenadoria Regional de Saúde;

XI - adotar sistemas de escalas de revezamento de turnos e de alterações de jornadas sempre que necessário, considerando a área física e o número de trabalhadores, a fim de reduzir fluxos, contatos e aglomerações, observando o afastamento mínimo, conforme Modelo de Distanciamento Controlado;

XII - adotar o distanciamento seguro de, no mínimo, 2,0 metros entre os trabalhadores, com demarcação do espaço de trabalho sempre que possível, dentro do fluxo operacional do trabalho, e também nos acessos, nas portarias, entradas e saídas dos turnos de trabalho, vestiários e áreas de lazer;

XIII - observar que o distanciamento mínimo de 2,0 metros entre os trabalhadores poderá ser reduzido para o mínimo de 1,0 metro no caso de utilização de Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) ou máscaras de proteção facial adequados para evitar contaminação e transmissão do novo Coronavírus;

XIV - recomenda-se de forma complementar ao disposto no inciso XIII, adotar barreiras físicas entre os trabalhadores, de material liso, resistente, impermeável e que permita fácil higienização a cada troca de trabalhador no posto de trabalho;

XV - fornecer Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados para o exercício das atividades funcionais, em quantidades suficientes para cada trabalhador, e orientar sobre sua correta utilização, conforme especificado nas Normas Regulamentadoras da Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia, normas e recomendações do Ministério da Saúde e da SES-RS, Normas Regulamentadoras da atividade e normas ABNT. Caso as atividades não possuam protocolos específicos de EPIs, o empregador deverá fornecer para cada trabalhador máscaras em quantidade e material adequados, conforme normas e recomendações do Ministério da Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

XVI - escalonar os horários de pausas e refeições, obedecendo às regras de distanciamento interpessoal conforme estabelecido nas Regras Estaduais do Sistema de Distanciamento Controlado;

XVII - capacitar os trabalhadores para a execução das medidas de prevenção de contaminação pelo novo coronavírus, incluindo a capacitação para a paramentação e desparamentação dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e máscaras de proteção facial, inclusive com relação ao descarte;

XVIII - programar a utilização de vestiários a fim de evitar agrupamento e cruzamento entre trabalhadores (fluxo interno de entrada e saída), assegurando o distanciamento mínimo entre cada indivíduo e reforço nas rotinas de higienização;

XIX - proibir a reutilização de uniformes, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e máscaras de proteção facial, quando tais vestimentas/equipamentos não estejam devidamente higienizados;

XX - adotar estratégias e ações educativas de divulgação e informação sobre as medidas de prevenção à COVID-19, assegurando ampla divulgação das informações a todos que acessem as dependências da indústria, principalmente nos pontos de maior fluxo, tais como entradas da empresa, refeitórios, áreas de convivência e de transporte;

XXI - observar, para o transporte fretado de trabalhadores, as regras estaduais do Sistema de Distanciamento Controlado em relação ao teto da operação, bem como as regras de higienização e ventilação;

XXII - disponibilizar sabonete líquido/espuma e papel toalha nos pontos de higienização das mãos, instalações sanitárias, lavatórios e refeitórios, e álcool em gel 70% ou outro antisséptico, nas áreas de convivência e nos acessos aos setores de trabalho onde houver maior circulação;

XXIII - higienizar, após cada uso, antes dos rodízios das funções e durante o período de funcionamento, as áreas de circulação (inclusive os refeitórios, vestiários e áreas de convivência), as superfícies de toque (cadeiras, maçanetas, portas, corrimãos, apoios em geral e objetos afins) e os veículos de transporte de trabalhadores ao final de cada viagem, preferencialmente com álcool 70% (setenta por cento) ou hipoclorito de sódio 0,1% (água sanitária), ou outro desinfetante indicado para este fim;

XXIV - realizar higienização total dos espaços de trabalho e de circulação após cada turno de atividade;

XXV - manter ligados, quando possível, durante a jornada laboral e, obrigatoriamente, durante o período de higienização, os exaustores existentes nos ambientes refrigerados, atendendo os parâmetros de temperatura setorial determinados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ou pela Secretaria Estadual da Agricultura, visando a aumentar a taxa de renovação de ar;

XXVI - XXVI - manter os ambientes climatizados, os locais de circulação e as áreas comuns com os sistemas de ar condicionado limpos (filtros e dutos) e, obrigatoriamente, manter pelo menos uma janela externa aberta ou qualquer outra abertura, contribuindo para a renovação de ar;

XXVII - proibir o uso de bebedouro no modo de uso jato inclinado, adaptando-o para que o consumo de água seja somente com uso de copos descartáveis;

XXVIII - afastar as mesas do refeitório e garantir que durante o seu uso os trabalhadores mantenham distância de, no mínimo, 2,0 metros entre si, organizando-se os assentos de forma alternada para que não sejam fixados ao lado ou a frente uns dos outros;

XXIX - substituir os sistemas de autosserviço de bufê nas empresas que disponibilizam refeitórios, pela entrega de porções individualizadas ou pela designação de trabalhadores(s) específico(s) para servir todos os usuários do refeitório, orientando esses para que mantenham, em filas, distância de 2,0 metros entre si, bem como a utilização de máscaras faciais até o final do processo, minimizando o risco de contaminação;

XXX - entregar kits de utensílios higienizados (prato, talheres, guardanapo de papel) embalados individualmente para cada trabalhador nos locais das refeições;

XXXI - não disponibilizar dispenseres de temperos (azeite, vinagre e molhos), saleiros e farinheiros, bem como os porta-guardanapos de uso compartilhado;

XXXII - fornecer máscaras de proteção facial e luvas descartáveis aos trabalhadores que prepararem e servirem as refeições, bem como orientá-los a, promover rigorosa higiene das mãos;

XXXIII - limpar e desinfetar as superfícies das mesas após cada utilização;

XXXIV - eliminar lixeiras cuja utilização demande contato manual para abertura da tampa;

XXXV - garantir a articulação entre o Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) e a Vigilância Epidemiológica do Município, com vista ao aprimoramento da detecção de possíveis casos suspeitos nos serviços de saúde, bem como observar as diretrizes do Ministério da Saúde, das Secretarias Estadual e Municipal de Saúde;

XXXVI - implantar medidas de fiscalização permanentes e efetivas para o cumprimento das determinações desta Portaria, especialmente quando a empresa depender da colaboração dos prestadores de serviço.

Art. 4º As empresas de que trata esta Portaria deverão adotar os seguintes procedimentos em caso de surtos de síndrome gripal ou constatação de crescimento exponencial de casos de COVID-19:

I - considerar o afastamento das atividades, por grupo de trabalhadores de um setor, turno ou de toda a unidade como estratégia apta a conter o crescimento de casos e a repercussão na saúde pública local;

II - comunicar à Vigilância em Saúde Municipal, bem como à Coordenadoria Regional de Saúde, o local de residência dos trabalhadores afastados, a fim de que sejam traçadas estratégias conjuntas de orientação, isolamento e monitoramento.

Art. 5º Os trabalhadores das indústrias de abate e processamento de carnes e pescados nas plantas frigoríficas deverão adotar, sob as orientações e fiscalização da empresa, as seguintes medidas para prevenção e controle à COVID-19 (novo coronavírus):

I - usar, obrigatoriamente, máscara de proteção facial no transporte e no estabelecimento;

II - utilizar uniformes, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e máscaras de proteção facial devidamente higienizados;

III - higienizar as mãos com água e sabonete líquido/espuma ou álcool em gel 70%, periodicamente, em especial ao mudar de ambiente de trabalho ou manusear uniformes, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) ou máscaras de proteção facial;

IV - evitar tocar o rosto, em particular os olhos, a boca e o nariz;

V - manter a distância de 2,0 metros em relação a outras pessoas ou de pelo menos 1 metro quando estiver utilizando Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) ou máscara de proteção facial, inclusive nos locais de entrada e saída da empresa, refeitórios, nas áreas de convivência durante as pausas programadas e nos meios de transporte fretados pela empresa;

VI - não compartilhar talheres, copos e utensílios de uso pessoal;

VII - observar a etiqueta respiratória, cobrindo a boca, ao tossir ou ao espirrar, com o antebraço ou com lenço descartável.

Art. 6º Os veículos transportadores de animais, matéria-prima, insumos, embalagens e de produto pronto devem ser higienizados e sanitizados previamente ao seu acesso no perímetro industrial.

Art. 7º As medidas estipuladas nesta Portaria abrangem os trabalhadores, terceirizados, prestadores de serviços e visitantes, sendo responsabilidade da empresa garantir o seu cumprimento.

Art. 8º Os casos omissos e as eventuais exceções à aplicação desta Portaria serão avaliados e definidos pela Secretaria Estadual de Saúde.

Art. 9º A fiscalização das indústrias de que trata esta Portaria ficará a cargo das equipes de fiscalização competentes do Estado e dos respectivos Municípios.

Art. 10 O descumprimento das determinações desta Portaria constitui infração de natureza sanitária, sujeitando o infrator ao processo e às penalidades previstas na legislação pertinente, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

Art. 11 Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação e tem vigência limitada ao período em que durar o estado de calamidade pública em função da pandemia do Coronavírus. (grifei).

Constato que a referida Portaria SES nº 407/2020 reforçou a necessidade de providências e ampliou as medidas a serem adotadas pelos frigoríficos à prevenção e ao controle do novo Coronavírus. Observo, ainda, que esta norma estadual encontra-se em pleno vigor, considerando seu art. 11 e sua publicação no Diário Oficial do dia 08/06/2020.

b) Fatos amplamente divulgados

No caso específico dos autos, tem sido amplamente divulgado pelos meios de comunicação que o frigorífico litisconsorte apresenta número expressivo de empregados contaminados pelo novo Coronavírus, inclusive com óbitos desde o mês de abril, como bem pontua o impetrante, sendo a região da cidade de Passo Fundo/RS bastante atingida pelo COVID-19 em comparação com outras regiões do Estado.

Sinalo que, desde março de 2020, a imprensa tem noticiado surtos de COVID-19 em várias unidades de frigoríficos neste Estado, o que, por fim, ensejou a publicação da Portaria SES nº 407/2020.

A título exemplificativo, cito as seguintes notícias:

- em 27/04/2020: "Governo do RS publicará regras para tentar conter focos de coronavírus em frigoríficos - [...] Além da portaria com regras para o funcionamento de frigoríficos, o governo estadual irá publicar ainda uma nota informativa para instruir as vigilâncias municipais de saúde sobre como atuar nos surtos que afligem o setor. A SES confirma que já ocorreram óbitos nas plantas frigoríficas, mas diz que não irá expor números no momento, alegando que os levantamentos e estudos ainda são precoces. O caso mais grave foi detectado em Passo Fundo: na sexta-feira (24), a unidade da JBS na cidade foi interditada por tempo indeterminado após 19 dos 2.650 trabalhadores testarem positivos para coronavírus. Levantamento desta segunda-feira do Ministério Público do Trabalho (MPT), com base em dados oficiais das secretarias da Saúde do Estado e dos municípios, indica que os casos positivos na planta da JBS em Passo Fundo já saltaram para 48, com três mortes de familiares de trabalhadores. No final de semana, ocorreram óbitos de empregados de frigoríficos em Garibaldi e Lajeado - no caso de Lajeado, a vítima residia em Venâncio Aires. No somatório, são dezenas de casos positivos, incluindo cidades como Marau, Serafina Corrêa e Encantado. [...]" (https://gauchazh.clicrbs.com.br/coronavirus-servico/noticia/2020/04/governo-do-rs-publicara-regras-para-tentar-conter-focos-de-coronavirus-em-frigorificos-ck9iw5ndy00jf017ni365homp.html, acessado em 09/06/2020);

- em 03/05/2020: "Avanço da Covid-19 em frigoríficos segue preocupando o RS - [...] As ações para conter o avanço do coronavírus entre funcionários de frigoríficos no Rio Grande do Sul prosseguiram durante todo o feriado e devem ter avanços nesta semana. A partir desta segunda-feira, por exemplo, o Frigorífico Nicolini anunciou que ficam suspensos por duas semanas o transporte de funcionários nas cidades de São Sebastião do Caí e São Leopoldo como forma de minimizar riscos de propagação da doença. O setor entrou em alerta após a interdição da unidade da JBS em Passo Fundo, onde quase 50 funcionários já tiveram a contaminação pela Covid-19 confirmada. Dois familiares de funcionários vieram inclusive a obtido pela doença. [...] Na última quinta-feira (30/04), o Ministério Público do Trabalho (MPT) obteve a primeira liminar contra um frigorífico, no Rio Grande do Sul, desde o início da pandemia. A Justiça do Trabalho atendeu pedido de tutela de urgência em caráter antecipado para obrigar a JBS Aves Ltda, em Trindade do Sul, a melhorar seus controles para evitar a exposição indevida de seus trabalhadores e, assim, também evitar a propagação dos casos para população em geral. De acordo com o MPT, e em audiência no dia 22 de abril, a JBS no município assegurou que executava diversas das medidas, mas cinco dias depois o órgão recebeu denúncia encaminhada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação de Trindade do Sul de que uma trabalhadora do local teve diagnóstico de Covid-19 e não houve afastamento de colegas que eram transportados e trabalhavam próximos. [...]" (https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/economia/2020/05/737162-avanco-da-covid-19-em-frigorificos-segue-preocupando-o-rs.html, acessado em 09/06/2020);

- em 11/05/2020: "Paralisação de frigoríficos por Covid-19 no RS acende alerta - [...] Em Passo Fundo, a decisão de fechar o frigorífico da JBS partiu da prefeitura, porque a cidade é uma das mais afetadas pelo novo coronavírus. O município já soma 18 mortes por novo coronavírus, acima da capital gaúcha Porto Alegre. Já em Lajeado a iniciativa de pedir a interrupção das atividades nas plantas partiu do Ministério Público Estadual. As empresas recorreram, mas a Justiça manteve a liminar. [...]" (https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/05/11/paralisacao-de-frigorificos-por-covid-19-no-rs-acende-alerta, acessado em 09/06/2020);

- em 13/05/2020: "Coronavírus: o avanço silencioso da covid-19 em frigoríficos do Brasil - Nas últimas semanas, quatro unidades no Rio Grande do Sul foram fechadas após a ocorrência de surtos da doença entre funcionários. [...] Já são quase 250 casos confirmados entre funcionários e cerca de 20 mil trabalhadores expostos, segundo o último boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria de Saúde. O rápido aumento de infecções preocupa as autoridades de saúde porque este é um segmento intensivo em mão de obra - e sua própria estrutura operacional favorece a disseminação do novo coronavírus. [...] Devido à multiplicação de casos em poucos dias, entretanto, nas duas últimas semanas pelo menos 4 fábricas tiveram de interromper a produção - total ou parcialmente. Na quinta e sexta-feira da última semana, o Tribunal de Justiça do RS determinou a paralisação integral de um frigorífico da BRF na cidade de Lajeado e parcial de uma unidade da Minuano na mesma cidade, que deve operar com 50% da mão de obra por duas semanas. Dias antes, a empresa Nicolini havia informado decisão de fechar por três dias a unidade em Garibaldi para limpeza das áreas internas e externas depois de registrar 60 casos de covid-19 entre os 1,5 mil funcionários. As medidas foram firmadas por meio de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS). [...] Passo Fundo, que contabiliza pouco mais de 200 mil habitantes, está "empatada" com Porto Alegre em número de mortes causadas pela covid-19 - foram 18 até o dia 11/05. O volume de casos é cerca de metade (267) do registrado na capital (529), mas, por se tratar de um município menor, a incidência é bem mais elevada: são 135,7 casos a cada 100 mil habitantes, ante 35,8 a cada 100 mil habitantes na capital. [...] Não por acaso, frigoríficos em outros países acabaram se tornando foco da doença causada pelo novo coronavírus. Nos Estados Unidos, por exemplo, a disseminação de covid-19 entre trabalhadores do setor levou empresas como a gigante Tyson Foods a paralisar temporariamente as atividades nas últimas semanas. [...] O caso mais problemático até o momento é o do frigorífico da JBS em Passo Fundo, que foi interditado por duas semanas pela Justiça em 24 de abril. [...] Paulo Madeira, da Federação dos Trabalhadores na Alimentação do Estado, diz que a gerência da unidade foi uma das mais resistentes em implementar as medidas recomendadas para evitar surtos de covid-19 entre os empregados. Tive medo de trabalhar. Qualquer sintoma de gripe achava que tinha pegado", diz um dos funcionários, que pediu para ter a identidade preservada. Segundo ele, os trabalhadores não foram informados sobre os primeiros casos na unidade. Quando começou a ver pessoas próximas sendo afastadas com a doença, ele e outros colegas chegaram a conversar com supervisores. "Falaram que não podiam fazer nada, que também estavam com medo de trabalhar, como a gente." Um caso emblemático para ele foi de um funcionário da limpeza que vinha se queixando de muita dor nas costas e, posteriormente, teve o diagnóstico de covid confirmado. "Nem febre ele teve. Às vezes essa doença não dá febre. E tem ainda aqueles assintomáticos, que não sentem nada e estão passando a doença para outras pessoas. [...]" (https://www.terra.com.br/noticias/brasil/coronavirus-o-avanco-silencioso-da-covid-19-em-frigorificos-do-brasil,07729d1f81c90d09f9acbe6b245070702w3totby.html, acessado em 09/06/2020);

- em 26/05/2020: "Coronavírus: frigoríficos concentram um terço dos casos de covid-19 no RS, diz Ministério Público do Trabalho - [...] O Ministério Público do Trabalho (MPT) contabiliza 2.079 casos confirmados de contaminação pelo novo coronavírus entre trabalhadores de 21 frigoríficos distribuídos por 16 municípios do Rio Grande do Sul. O número equivale a 32,1% dos 6.470 casos contabilizados pela Secretaria da Saúde do Estado até a tarde desta segunda-feira (25). O número total de trabalhadores nas 21 unidades é de 24.488, incluindo os que testaram positivo. Esse montante, por sua vez, equivale a quase 40% da mão de obra do setor no Rio Grande do Sul, que emprega cerca de 65 mil pessoas. Juntamente com o oeste de Santa Catarina, o Estado concentra o maior número de casos de covid-19 em frigoríficos no Brasil. [...]" (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52802100, acessado em 09/06/2020);

- em 04/06/2020: "Um terço dos casos de covid-19 no RS é de trabalhadores de frigoríficos, mostra estudo do MPT - [...] Um levantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT) mostra que 33,7% dos casos confirmados de coronavírus no Rio Grande do Sul são de trabalhadores de frigoríficos. Segundo o órgão, 3.201 empregados do setor tiveram ou estão com a doença em 26 plantas. Até a tarde desta terça-feira (2), em toda a população do Estado, os dados da Secretaria Estadual da Saúde apontavam que 9.496 pessoas foram testadas positivas para coronavírus. O levantamento do MPT é a partir de informações repassadas pelas secretarias de Saúde municipal e estadual - que já contam com os testes feitos pelos próprios frigoríficos. [...] Em razão das especifidades do setor, uma portaria da Secretaria Estadual da Saúde (SES) informa recomendações sanitárias específicas para frigoríficos, exatamente pelo risco maior de contágio. As regras são mais rígidas do que para o restante da indústria. A SES detalhou que em todos os casos de surtos confirmados em frigoríficos foram recomendadas medidas de restrição de fluxo, como afastamento de pessoas com sintomas, reforço de higienização, distanciamento maior, afastamento de pessoas no grupo de risco e realização de testes. [...]" (https://gauchazh.clicrbs.com.br/coronavirus-servico/noticia/2020/06/um-terco-dos-casos-de-covid-19-no-rs-e-de-trabalhadores-de-frigorificos-mostra-estudo-do-mpt-ckayaelqq004b015n4plbwb12.html, acessado em 09/06/2020);

- em 05/06/2020: "Surto de Coronavírus atinge 447 trabalhadores de frigorífico em Nova Araçá - [...] Em nota assinada em conjunto com a empresa, o município informou que os 1.296 trabalhadores foram testados e que 51 seguem com o vírus ativo, tendo sido afastadas das funções, em isolamento domiciliar. As outras 396 pessoas já se curaram da doença. Na semana passada, uma morte já havia sido confirmada no local. [...] Esse é o terceiro maior surto da Covid-19 no Rio Grande do Sul. Os dois primeiros foram registrados em Lajeado, no Vale do Taquari, com 966 casos confirmados em uma empresa e outros 512 em outra. Ao todo, o estado contabiliza 64 surtos em espaços fechados, com quase 2,8 mil infecções. [...] Conforme dados da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul (SES), o Estado já teve 64 surtos de síndrome gripal associadas à Covid-19 desde o início da pandemia. O levantamento considera os casos em instituições fechadas, como os registrados em frigoríficos espalhados pelo Interior. De acordo com a SES, os surtos ocasionaram pelo menos 2.954 casos de Covid-19. Das pessoas que se contaminaram a partir desses surtos, 18 faleceram - sete delas em Lajeado." (https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/cidades/surto-de-coronav%C3%ADrus-atinge-447-trabalhadores-de-frigor%C3%ADfico-em-nova-ara%C3%A7%C3%A1-1.432571, acessado em 09/06/2020);

- em 08/06/2020: "Trabalhadores de frigorífico são mais suscetíveis à covid, aponta MPT - [...] Ambiente úmido e gelado, temperatura na casa dos 10ºC. Aglomeração de pessoas trabalhando, literalmente, ombro a ombro, em uma disposição tanto lateral quanto frontal. Esse tipo de local de trabalho retrata, principalmente, as linhas de produção de frigoríficos especializados em abate de aves - no caso dos de bovinos e suínos, há um espaçamento um pouco maior. Além disso, os trabalhadores vão almoçar, bem como utilizam vestiários, ao mesmo tempo. Eles são oriundos de diversos municípios no entorno das plantas industriais e trazidos de suas casas e depois levados de volta em um mesmo ônibus. Soma-se a isso a falta de renovação de ar nesses ambientes gelados, imposta pela necessidade de se manter a qualidade dos produtos. [...] A estruturação do trabalho nesse setor é muito significativa, reconhece a médica veterinária formada pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Larissa de Borba Espíndula, responsável técnica em indústrias frigoríficas no Estado. "Por isso, a maioria dos casos de surto de Covid-19 [coronavírus] ocorreram em frigoríficos que trabalham com aves e quase nenhum ligado a bovinos", avalia. No Rio Grande do Sul, 27 plantas frigoríficas registram casos confirmados de coronavírus, conforme dados mais recentes do MPT-RS. Até o começo de junho, o segmento registrava três óbitos pela doença. No total, 52% dos surtos de coronavírus no Estado são decorrentes de frigoríficos. [...] O problema é registrado não só no Brasil, mas também em empresas no mundo todo. E as indústrias de proteína animal são suscetíveis não apenas ao coronavírus, mas a diversas zoonoses. Nesse sentido, a Fair Initiative - fundação inglesa mantida pela Jeremy Coller Foundation - divulgou, no dia 3 de junho, um estudo intitulado "Um setor Infectado". A pesquisa analisa essa problemática em 60 grandes companhias. 44 empresas foram consideradas de alto risco pandêmico, já as outras 16, classificadas como risco médio. Conforme o estudo alerta, o setor deve adotar rígidos protocolos de biossegurança. [...]" (https://www.brasildefators.com.br/2020/06/08/trabalhadores-de-frigorifico-sao-mais-suscetiveis-a-covid-aponta-mpt, acessado em 09/06/2020).

c) Processo de mediação nº 0021142-29.2020.5.04.0000

Após a impetração desta ação mandamental, foi proferida a seguinte decisão (ID. daa95ea - Pág. 1):

[...]

Considerando-se o conteúdo da certidão sob ID. f8c8411, remetam-se os autos ao CEJUSC - 2º Grau.

[...]

Depois do envio dos autos ao CEJUSC - 2º grau, foi proferido o despacho sob ID. 4442ef4:

[...]

Em 19/5/2020, conforme ajustado, o processo foi incluído em pauta.

Na petição de ID. 3ef5a88, todavia, a requerida JBS Aves LTDA. diz ter recebido comunicação do CEJUSC quanto à inclusão em pauta para tentativa de conciliação, e manifesta seu desinteresse no ato. Requer o cancelamento da audiência.

Inicialmente, considerando que a inclusão em pauta decorre de cumprimento da recomendação proferida pelo Exmo. Sr. Ministro Aloysio Silva Corrêa da Veiga nos autos da Correição Parcial, inviável o mero cancelamento da audiência.

Por outro lado, verifica-se do debate travado na audiência de 18/5, que qualquer avanço na implementação de medidas voltadas à adoção das obrigações objeto das ações subjacentes precisa passar por um debate mais amplo. Além das demandas acima referidas, tramitam ainda neste Tribunal outros dois Mandados de Segurança, autuados sob números 0020852-14.2020.5.04.0000 e 0020975-12.2020.5.04.0000, o primeiro movido pela União e o segundo pelo Ministério Público do Trabalho, ambos contra a empresa JBS Aves Ltda., todos envolvendo medidas de prevenção e controle da Pandemia de Covid-19 nas unidade do frigorífico.

Sendo assim, dado o caráter coletivo da matéria em apreço e a multiplicidade de demandas envolvidas, encaminho os processos MS nº 0020842- 67.2020.5.04.0000 e MS nº 0020862-58.2020.5.04.0000 à Vice-Presidência, a fim de que seja propiciada a tentativa de conciliação conjunta. Retire-se o feito de pauta, dando ciência às partes. Dê-se ciente do presente despacho aos respectivos Desembargadores-relatores.

Aline Doral Stefani Fagundes

Juíza do Trabalho

PORTO ALEGRE/RS, 20 de maio de 2020.

ALINE DORAL STEFANI FAGUNDES

Magistrada CEJUSC

A ata da primeira audiência de mediação possui o seguinte conteúdo (ID. 230829b):

[...]

Será aberto um procedimento específico de mediação com relação à JBS Aves Ltda e Seara Alimentos Ltda e as partes serão informadas por e mail.

Após mais de 2h de debates, verifica-se que a presente mediação necessita fixar seus objetivos. Fixa-se a controvérsia inicial com base na sugestão dos representantes do MPT, sem prejuízo dos demais pedidos formulados nas respectivas ações, nos seguintes pontos: a) fornecimento de máscaras e EPIs e respectiva certificação; b) medidas de distanciamento social com relação ao nível de proteção dos trabalhadores e usos de EPIs; c) efetiva adoção de medidas de busca ativa desenvolvidas pela empresa; d) elaboração de proposta concreta com relação ao prêmio assiduidade, no sentido de que não sejam descontados dos trabalhadores as hipóteses de ausências relacionadas a problemas decorrentes da pandemia; e) medidas de ventilação do local de trabalho.

A empresa responderá sobre os pontos acima fixados, até o final do dia 03/06/2020.

Designa-se nova audiência para dia 04/06/2020, às 9h.

[...]

Autuado o processo de mediação sob o nº 0021142-29.2020.5.04.0000, no prazo fixado, a litisconsorte JBS AVES LTDA. apresenta manifestação, argumentando que, "em relação aos cinco itens definidos na audiência de mediação, as quais entende adequadas e eficientes para a proteção de seus empregados e atendem 100% das exigências definidas pelo ordenamento jurídico e autoridades competentes, conforme demonstrado no Protocolo de Medidas de Prevenção e Combate ao Covid-19, documento anexo, que foi criado desde o início da pandemia e vem sendo aprimorado e revisado constantemente, sempre alinhado com as melhorias para a segurança e saúde dos trabalhadores." Discorre sobre as medidas que alega ter adotado para a prevenção e combate ao novo Coronavírus. Menciona que, "Em relação às unidades que tem implementado o premio assiduidade a empresa concorda em não computar para efeitos de não recebimento do premio as ausências dos empregados ao trabalho relacionadas à saúde, durante o período que perdurar a pandemia.". Junta documentos.

Na audiência realizada em 04/06/2020, foi encerrada a mediação por impossibilidade pela prosseguir com o processo de mediação (ID. f3cf386).

d) Análise da situação fática e das provas produzidas

No dia 24/04/2020, a litisconsorte JBS AVES LTDA., por meio do Termo de Interdição nº 4.042.302-6, teve paralisadas todas as atividades da unidade de Passo Fundo/RS, em razão da constatação dos casos de COVID-19 que passaram a ser registrados na empresa e da fiscalização dos Auditores-Fiscais do Trabalho, que verificaram a inadequação das medidas adotadas pela empregadora para evitar o contágio de seus empregados na sede interditada (ID. ef46af8), tais como aquelas citadas no ato coator, acima transcritas, às quais me reporto integralmente a fim de evitar tautologia.

Em pese que o laudo pericial produzido na ação matriz, e no qual a autoridade coatora baseou majoritamente sua decisão, entendo que os atos administrativos do Auditor-Fiscal do Trabalho gozam de presunção de veracidade, legitimidade e legalidade.

Acerca da legitimidade, a Portaria nº 1.069, de 23 de setembro de 2019, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, disciplina:

[...]

Art. 1º Disciplinar os procedimentos de embargo e interdição previstos na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT e na Norma Regulamentadora nº 03, considerando a decisão proferida no curso da Ação Civil Pública nº 0010450-12.2013.5.14.0008.

Art. 2º Os procedimentos previstos nesta Portaria revestem-se de caráter de urgência, tendo em vista a natureza preventiva das medidas de embargo e interdição, que têm por objeto evitar o dano à integridade física do trabalhador.

Art. 3º O embargo e a interdição são medidas de urgência, adotadas quando constatada condição ou situação de trabalho que caracterize grave e iminente risco ao trabalhador.

§ 1º Considera-se grave e iminente risco toda condição ou situação de trabalho que possa causar acidente ou doença com lesão grave ao trabalhador.

§ 2º O embargo implica a paralisação parcial ou total da obra.

§ 3º A interdição implica a paralisação parcial ou total da atividade, da máquina ou equipamento, do setor de serviço ou do estabelecimento.

Art. 4º Os Auditores Fiscais do Trabalho - AFT estão autorizados, em todo o território nacional, a ordenar a adoção de medidas de interdições e embargos, e o consequente levantamento posterior dos mesmos, quando se depararem com uma condição ou situação de risco iminente à vida, à saúde ou à segurança dos trabalhadores.

Parágrafo único. Para o início ou manutenção da produção de seus efeitos, o embargo ou interdição não depende de prévia autorização ou confirmação por autoridade diversa não envolvida na ação fiscal, ressalvada exclusivamente a possibilidade de recurso.

Art. 5º Quando o AFT constatar, em verificação física no local de trabalho, grave e iminente risco que, nos termos da Norma Regulamentadora nº 03, justifique embargo ou interdição, deverá lavrar, com a urgência que o caso requer, Relatório Técnico em duas vias, que contenha:

[...]

Art. 6º Os Termos e Relatórios Técnicos relativos a embargo ou interdição deverão descrever exclusivamente as situações de trabalho que possam causar acidente ou doença com lesão grave ao trabalhador.

[...]

Art. 7º A gravidade e iminência que ensejam o embargo ou a interdição devem ser caracterizadas a partir de elementos fáticos constatados na inspeção do local de trabalho, com alcance limitado ao local inspecionado, os quais podem ou não ser acompanhados de análise de elementos documentais.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica quando houver previsão expressa em norma de segurança e saúde de que a documentação, ou ausência desta, seja suficiente para caracterização de condição de grave e iminente risco.

[...]

Art. 11 O embargo ou a interdição produzirão efeitos desde a ciência, pelo empregador, do Termo respectivo.

[...] - grifei.

Não há dúvida, portanto, de que os Auditores-Fiscais do Trabalho são as autoridades competentes para determinar as interdições, quando constatadas situações de trabalho que possam causar acidente ou doença com lesão grave ao trabalhador, como ocorre nos autos, uma vez que o COVID-19 pode ocasionar o óbito de empregados da litisconsorte, caso não adotadas as medidas adequadas de prevenção e redução do risco de contágio.

Ainda, de acordo com a referida Portaria, entendo que os atos dos Auditores-Fiscais gozam de presunção de veracidade e legalidade, tanto que "Para o início ou manutenção da produção de seus efeitos, o embargo ou interdição não depende de prévia autorização ou confirmação por autoridade diversa não envolvida na ação fiscal, ressalvada exclusivamente a possibilidade de recurso".

Registro que, em pese da Medida Provisória nº 927/2020, em seu art. 31, tenha restringido a atuação dos Auditores-Fiscais à orientação, no período de 180 dias da entrada em vigor da referida MP, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento de sete Ações Diretas de Inconstitucionalidade, no dia 29/04/2020, suspendeu a eficácia daquele dispositivo legal. Assim, permanece vigente a Portaria nº 1.069, de 23 de setembro de 2019, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, no tocante à atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho.

Nesses termos, em sede de cognição sumária atinente ao mandado de segurança, prevalecem as fiscalizações procedidas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho na sede da litisconsorte e o respectivo Termo de Interdição nº 4.042.302-6.

No mesmo sentido, cito os seguintes precedentes desta 1ª SDI:

MANDADO DE SEGURANÇA. AUTOS DE INFRAÇÃO. Os autos de infração, na condição de ato administrativo vinculado, decorrente do regular exercício do poder de polícia do Estado, gozam de presunção de legalidade e de legitimidade, devendo ser desconstituídos por robusta prova em contrário, o que não se encontra na ação anulatória subjacente. (TRT da 4ª Região, 1ª Seção de Dissídios Individuais, 0022364-03.2018.5.04.0000 MSCiv, em 19/12/2018, Desembargador Fabiano Holz Beserra)

MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO ANULATÓRIA DE TERMO DE INTERDIÇÃO. TUTELA DE URGÊNCIA DE NATUREZA ANTECIPADA. ART. 300 DO NCPC. O direito em causa, cujo exame e concessão depende de regular instrução em jurisdição exauriente, não encontra respaldo em elementos probatórios capazes de justificar a suspensão do ato administrativo de interdição das atividades da impetrante. A observância dos requisitos do artigo 300 do NCPC pela autoridade dita coatora, ao indeferir a liminar requerida na ação matriz, autoriza e recomenda a denegação da segurança. (TRT da 4ª Região, 1ª Seção de Dissídios Individuais, 0022399-31.2016.5.04.0000 MSCiv, em 27/10/2017, Desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal)

Ainda que os atos dos Auditores-Fiscais do Trabalho não gozassem de presunção de veracidade, legitimidade e legalidade, prevalecendo sobre o laudo produzido por perita designada pelo Juízo da ação matriz, verifico que foram realizados inúmeros registros fotográficos pela fiscalização e que fragilizam demasiadamente as conclusões do laudo produzido na ação subjacente.

Como exemplo, cito as fotografias constantes no ID. a50e7b7 - Pág. 2-6, ID. 38ce6f6 - Pág. 1, ID. a10a340 - Pág. 4, ID. 014697f - Pág. 1, nas quais é possível apontar as seguintes situações: empregados usando máscara caseira de tecido, inclusive no setor de produção (manipulando pedaços de aves); funcionários em momento de lazer, com distância inferior a um metro; empregado trabalhando fora da marcação feita no piso que serviria para preservar o distanciamento mínimo; "barreiras físicas" instaladas de forma inadequada, considerando a altura dos empregados, de forma que não protegem os funcionários com estatura mais baixa; funcionários utilizando o refeitório da empresa com distância diminuta entre eles; empregados aguardando o transporte coletivo, sem o uso de máscara, sentados lado a lado, dentre outras.

Os registros fotográficos indicam, portanto, que não só a litisconsorte não implementou as medidas necessárias, como não orientou e/ou inexistiu fiscalização eficiente da empregadora no cumprimento das normas de vigilância e saúde por parte de seus empregados.

Chama a atenção, também, o fato de que, conforme fiscalização procedida pelos Auditores-Fiscais e pela Vigilância Sanitária do Município, os termômetros utilizados pela litisconsorte para medir a temperatura de seus empregados apontaram 30ºC e 32ºC - temperaturas estas que sequer são compatíveis com as condições normais dos seres humanos, configurando-se um quadro de hipotermia moderada, com consequências fisiológicas e neurológicas, uma vez que a temperatura média do corpo humano varia entre 36,5ºC e 37,5ºC. Por óbvio, as medições de temperatura realizadas pela empregadora não correspondem à realidade, não sendo adequadas para indicar eventual infecção pelo novo Coronavírus entre seus funcionários.

Mostra-se, ainda, injustificável a conduta da litisconsorte de não notificar o órgão competente acerca dos casos suspeitos e confirmados de COVID-19 do seu quadro de funcionários, conforme evidenciam os prontuários de atendimentos realizados pelo médico da empregadora e a Vigilância Sanitária do Município.

Friso que a ação fiscal foi iniciada em 22/04/2020, após ofício recebido da Coordenadoria de Vigilância em Saúde de Passo Fundo, que constatou diversas irregularidades relacionadas ao combate do novo Coronavírus pela litisconsorte (ID. ef46af8).

Nesse ponto, importante destacar que as irregularidades constatadas pela Coordenadoria de Vigilância em Saúde de Passo Fundo, ainda que possam ter algumas semelhanças com as irregularidades apuradas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, não são idênticas. Os itens relacionados pelos Auditores-Fiscais são muito mais numerosos do que aqueles apontados pela fiscalização municipal, que, por óbvio, dizem respeito apenas à matéria de competência da Coordenadoria de Vigilância em Saúde de Passo Fundo, não adentrando na competência da fiscalização procedida pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, justificando a significativa diferença no número de medidas que ensejou a interdição da planta de Passo Fundo da litisconsorte JBS AVES LTDA. (em 07/05/2020) e sua posterior desinterdição pelo Município (em 13/05/2020) e as razões pelas quais o Ministério Público do Trabalho pretende a concessão da liminar no mandado de segurança.

Reitero: o Termo de Interdição nº 4.042.302-6, produzido por Auditores-Fiscais do Trabalho, é muito mais amplo do que o Termo de Interdição elaborado pela Coordenadoria de Vigilância em Saúde de Passo Fundo, indicando dezenas de irregularidades que não são objeto do Termo de Interdição do Município, pois este sequer teria competência para proceder interdição fundamentada em irregularidades cuja competência para fiscalização e interdição é dos Auditores-Fiscais do Trabalho.

Sinalo, ainda, que, em ação mandamental, deve prevalecer o direito de proteção à saúde, à dignidade da pessoa humana e à redução dos riscos inerentes ao trabalho, assegurados na Constituição Federal:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

[...]

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; (grifei).

Importante ressaltar, também, que a mesma Constituição, a partir do seu art. 196, disciplina, especificamente, as questões relativas à saúde:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. [...].

Realço que, aos Auditores-Fiscais do Trabalho, foi confirmado pelo gerente Eduardo Pozzebon que 50% da produção da unidade interditada é destinada à exportação (ID. 38ce6f6 - Pág. 3, sequer podendo-se cogitar que a interdição das atividades da litisconsorte no Município de Passo Fundo ou a implementação de medidas mais rigorosas de prevenção e combate ao novo Coronavírus possam colocar em risco atividade essencial à população brasileira.

Registro, por fim, que as irregularidades constatadas por meio da fiscalização dos Auditores-Fiscais do Trabalho ultrapassam a esfera pessoal de cada empregado da litisconsorte, colocando em risco, no mínimo, toda coletividade do Município de Passo Fundo e dos demais Municípios onde residem os funcionários da JBS, especialmente os familiares em grupo de risco que vivem com os trabalhadores da litisconsorte.

No tocante às efetivas medidas a serem adotadas pela litisconsorte JBS AVES LTDA., entendo inexistir dúvida de que a legislação estadual vigente deve ser integralmente cumprida, de imediato, conforme art. 11 da Portaria SES nº 407/2020.

Ainda, a referida Portaria é expressa ao disciplinar que as medidas nela elencadas são as providências mínimas a serem adotadas pelos frigoríficos: "As indústrias de abate e processamento de carnes e pescados deverão elaborar plano de contingência para prevenção, monitoramento e controle da transmissão da COVID-19, firmado por profissional técnico, que contemple, no mínimo, as seguintes medidas: [...]".

Importante destacar que a JBS AVES LTDA., em sua manifestação neste mandado de segurança e nos autos do processo de mediação nº 0021142-29.2020.5.04.0000, expressamente: a) afirma que instituiu Protocolo próprio que está sendo integralmente cumprido em sua planta de Passo Fundo; b) menciona que entende que as providências contidas no seu Protocolo são necessárias e adequadas à prevenção e ao combate do novo Coronavírus para manter a saúde de seus trabalhadores; c) discorre sobre medidas adotadas na unidade de Passo Fundo acerca dos 5 itens tratados na primeira audiência de mediação.

Sem dúvida, o mandado de segurança não comporta dilação probatória. Porém, tal não significa que as partes estejam dispensadas de apresentar provas de suas alegações e/ou dispensadas de comprovar o cumprimento do ordenamento jurídico vigente e das determinações judiciais.

E, no caso, em que pese todas as alegações da litisconsorte JBS AVES LTDA, conforme acima referido, verifico que não há prova de que ela tenha implementado as medidas necessárias à prevenção e ao combate da COVID-19, sequer comprovando as medidas que ela própria relata estar praticando.

Saliento, nesse aspecto, que a mera juntada de Protocolo não faz prova de sua efetiva implementação, inclusive porque documento produzido de forma unilateral.

As conclusões periciais apontadas na ação subjacente, a meu ver, também não desconstituem a fiscalização realizada pelos Auditores-Fiscais, pois, como já referido acima, goza de presunção de legitimidade, veracidade e legalidade, ao passo que o laudo pericial não possui estas mesmas prerrogativas e não vincula o juízo, nos termos da norma do art. 479 do CPC c/c art. 769 da CLT:

Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito.

[...]

Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título. (grifei)

Em resumo, tem-se, de um lado, o Termo de Interdição expedido pelo Ministério da Economia - Secretaria Especial da Previdência e Trabalho, Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, Superintendência Regional do Trabalho no Rio Grande do Sul, baseado em fiscalização procedida por Auditores-Fiscais do Trabalho, que goza de presunção de legitimidade, veracidade e legalidade; de outro lado, um Protocolo de medidas elaborado unilateralmente pela litisconsorte JBS AVES LTDA. e sem prova a desconstituir a presunção do Termo de Interdição, bem como um laudo pericial que não vincula o juízo e que não goza das mesmas prerrogativas dos atos dos Auditores-Fiscais do Trabalho, e cujas conclusões são bastante fragilizadas, considerando-se os registros fotográficos trazidos no Relatório do Termo de Interdição, tudo conforme já fundamentado acima.

Entendo que tais fatos, por si só, evidenciam o direito líquido e certo do impetrante.

Aliado a isso, a questão de maior relevância deste mandado de segurança é a proteção à saúde e à vida dos empregados da litisconsorte, de suas famílias e de todas as demais pessoas com quem eventualmente possam manter contato (a comunidade em geral das cidades onde habitam).

O país, infelizmente, ultrapassou, atualmente, a marca de 1.000.000 (um milhão) de pessoas infectadas e o recorde de 50.000 óbitos por causa do novo Coronavírus, dados que o colocam em segundo lugar no número de mortes no mundo.

Reitero que todas as ponderações acima não se constituem dilação probatória, mas visam conferir à saúde e à vida o efetivo valor de direito social assegurado no art. 6º da Constituição Federal, que deve ser garantido pelo Poder Judiciário. Eventual existência de dúvida, neste caso, deve militar a favor dos empregados, seus familiares e da comunidade em geral do Município de Passo Fundo e região.

Friso que todas as boas intenções relatadas pela litisconsorte JBS AVES LTDA não podem permanecer apenas no âmbito da argumentação ou na produção de prova unilateral, sendo necessária a implementação e a comprovação das medidas adequadas e efetivas para a prevenção e ao combate do novo Coronavírus e, nos termos do art. 9º do Decreto Estadual nº 55.240/2020, às autoridades públicas não é opcional "exigir o cumprimento das medidas e providências necessárias para a prevenção e o enfrentamento à epidemia de COVID-19, observado o disposto neste Decreto." Constitui-se uma obrigação definida por lei e dotada de urgência.

Destaco, por fim, que é incontroverso que a litisconsorte não buscou a desinterdição de forma administrativa, não requereu nova fiscalização dos Auditores-Fiscais do Trabalho, afirmou expressamente não ter interesse na realização de audiência de conciliação no CEJUSC - 2º grau e a tentativa de mediação pela Vice-Presidência foi inexitosa, gerando o convencimento de que a espera pelo julgamento da ação subjacente colocará em risco, diariamente, a totalidade dos funcionários da empresa e toda comunidade da cidade de Passo Fundo e região. Não se desconhece que a litisconsorte esteja envidando esforços na prevenção e no combate do novo Coronavírus, mas se desconhece quais medidas tenham sido efetivamente implementadas na planta de Passo Fundo/RS, pela ausência de prova aptas nesse aspecto.

Inexistindo elementos suficientes, nesta ação mandamental, para desconstituir o Termo de Interdição a que se refere a ação matriz, este deve ser mantido, observando-se toda legislação federal e estadual vigente que dispõe sobre a prevenção de contágio do novo Coronavírus e as práticas a serem adotadas pela tal.

Há elementos, portanto, que evidenciam a probabilidade do direito buscado pelo impetrante, bem como o perigo do dano e o risco ao resultado útil da ação subjacente, nos termos da norma do art. 300 do CPC, entendendo-se, pois, pela existência do direito líquido e certo do impetrante.

Assim, constatada a presença dos requisitos previstos no art. 300 do CPC para o deferimento da tutela de urgência de natureza antecipatória, é ilegal a decisão que a indefere, proponho à Seção que conceda a segurança para, confirmando a liminar deferida neste mandado de segurança, cassar em parte a liminar proferida na ação subjacente nº 0020284-43.2020.5.04.0664, que tramita perante a 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo/RS, restabelecendo o Termo de Interdição nº 4.042.302-6, até que a litisconsorte comprove o atendimento rigoroso e integral do mesmo, sob pena de multa de R$ 10.000,00, por dia e por empregado, sem prejuízo de outras medidas que visem dar efetividade a presente decisão, em caso de funcionamento da sede do Município de Passo Fundo/RS, sem cumprir as exigências do Auto de Interdição.

Prejudicado o agravo regimental.

MARCOS FAGUNDES SALOMAO

Relator

VOTOS

DESEMBARGADOR MANUEL CID JARDON:

Na condição de revisor, acompanho o voto do Exmo. Relator

DESEMBARGADOR JOÃO PAULO LUCENA:

Ressalvado meu entendimento, e posição que tenho adotado nestes casos de medidas sanitárias a serem observadas pelas empresas, qual seja, de intervenção mínima do Poder Judiciário na ação do gestor e das autoridades de saúde e de regulação/fiscalização do trabalho, no caso especificamente das que exploram atividade de frigoríficos, e ainda mais especificamente do grupo JBS, dada a conduta que este conglomerado vem adotando, dissonante inclusive das outras grandes empresas do mesmo ramo econômico, que a meu ver se evidencia recalcitrante no cumprimento das normas, além de não colaborativa ou pouco colaborativa com as autoridades - à guisa de exemplo, como pontuado no parecer do MPT, "o GRUPO JBS, É O ÚNICO DO SETOR, que se nega, tanto a firmar Termos de Ajuste de Conduta, quanto Acordos Judiciais em Ações Civis Públicas, apostando na procrastinação da resolução de conflitos como estratégia para se omitir a adotar medidas efetivas de prevenção à COVID-19, em seus frigoríficos, sendo que muitas unidades que vem se transformando em um verdadeiro foco de transmissão de Covid-19, aos seus empregados e a população em geral." - no presente caso, pois, em razão desta situação específica, acompanho integralmente o voto condutor do Exmo. Des. Marcos Fagundes Salomão.

DESEMBARGADORA ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER:

Com devida vênia do Exmo. Relator, acompnaho a divergência lançada pelo Des. Rosiul de Freitas Azambuja.

DESEMBARGADOR ROSIUL DE FREITAS AZAMBUJA:

Peço vênia ao relator para divergir:

A atividade da empresa é essencial, pois se trata de indústria de alimentação.

A empresa demonstra ter adotado inúmeras preventivas para evitar contágio relativo ao Covid-19.

No entanto, não há como exigir da empresa o cumprimento de situações não previstas legalmente e determinar a interdição da empresa.

No caso dos autos, a ação subjacente trata-se de ação anulatória visando anular auto de interdição do parque fabril da empresa.

Prudentemente, a autoridade coatora determinou a realização de perícia médica no âmbito da empresa.

Baseado no laudo pericial, a autoridade coatora analisa as questões levantadas de forma minuciosa e entendo desnecessário colar a decisão, tendo em vista a sua extensão encontrando-se lançada de forma resumida no voto do relator.

Concedida a liminar pelo relator restabelecendo a interdição, houve despacho em correição parcial determinando efeito suspensivo ao agravo regimental no processo 0020852-14.2020.504.0000 que trata também da interdição da empresa e que transcrevo abaixo:

Verifica-se dos documentos constantes dos autos que a determinação de interdição do estabelecimento da empresa por meio de liminar deferida no Mandado de Segurança resultou de nova ordem de interdição realizada pela autoridade municipal de saúde, diversa daquela que foi objeto da perícia realizada. Tal interdição ocorreu em 07/05/2020, em conclusão cuja análise refoge ao escopo e objeto da presente CorreiçãoParcial, a qual não se presta ao reexame de documentos para fins de desconstituir laudo de Número do processo: 1000514-13.2020.5.00.0000

Assim, não subsiste mais o fundamento utilizado para abarcar a conclusão acerca da necessidade de deferimento da liminar em sede de mandado de segurança, quanto ao elemento que respaldaria a imprestabilidade da prova técnica produzida no processo em trâmite na 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo, que por sua vez havia respaldado a conclusão do Juiz de primeiro grau para indeferir a tutela de urgência deferida.

O documento de fls. 109 evidencia que o novo ato da autoridade municipal efetivado em 13/05/20 concluiu que, nada obstante a interdição realizada tivesse se mostrado adequada para o momento em que imposta, após o contraditório oportunizado à empresa restou evidenciada a possibilidade de reabertura da planta produtiva, tal e qual observado pelo Exmo. Juiz da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo. O mesmo documento reconheceu os impactos do fechamento determinado, que se fazia necessário ante a ausência de evidências, até o momento da interdição, acerca das medidas de contenção do risco e monitoramento aplicadas pela Requerente.

No caso aqui analisado, a insubsistência do ato que motivou a decisão proferida em sede de mandado de segurança é suficiente à conclusão acerca de ato atentatório aos normativos que regem a matéria, caso se permita a manutenção da interdição do estabelecimento sem qualquer ressalva e em contrariedade à conclusão da autoridade sanitária competente e da prova técnica produzida, sob pena de inviabilidade ou prejuízo à continuidade das atividades tidas por essenciais.

Sem emitir juízo de valor a respeito da matéria jurisdicional debatida nos autos principais, verifica-se que, não havendo dúvidas acerca da necessidade de medidas emergenciais a serem tomadas por todos no combate à pandemia do COVID-19, tal escopo de prevenção parece, em análise superficial, que já vem sendo atendido de maneira emergencial pelo Requerente, tudo a respaldar os requisitos hábeis a demandar a concessão da liminar requerida, nos termos do parágrafo único do artigo 13 do RICGJT.

Ante todo o exposto, com fundamento no parágrafo único do artigo 13 do RICGJT, a liminar requerida para conceder efeito suspensivo ao Agravo Regimental DEFIRO interposto à decisão proferida no Mandado de Segurança nº 0020852-14.2020.5.04.0000, até que ocorra o exame da matéria pelo órgão jurisdicional competente.

Ressalta-se que a presente medida não tem o condão de afastar as condicionantes determinadas e estabelecidas pela Secretaria Municipal de Saúde por meio do laudo de fls. 109.

Recomenda-se, outrossim, que sejam seguidas as orientações constantes da Recomendação CSJT.GP 001/2020, no tocante à tentativa de composição relativa às situações decorrentes da contingência de pandemia.

Dê-se ciência do inteiro teor da decisão ora proferida, com urgência, ao Requerente, ao Exmo. Desembargador Marcos Fagundes Salomão, do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região - inclusive para que preste as informações que entender pertinentes, no prazo de 10 (dez) dias - bem como ao Terceiro Interessado.

Observe-se a Portaria 57/2020 do CNJ, comunicando-se ao Conselho Nacional de Justiça o teor da presente decisão, observados os termos do art. 4º do citado ato normativo.

Não vejo como entender como ilegal a decisão na origem, pois o juiz foi prudente e determinou a realização de perícia médica.

E sua decisão está pautada na prova técnica.

Transcrevo a parte final da excelente decisão proferida pelo juiz Luciano Ricardo Cembranel em que acrescenta mais exigências além daquelas já adotadas pela empresa:

Pelo exposto, em sede de tutela de urgência, julgo insubsistente a interdição, exceto: a) no que tange à necessidade de comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, devendo ser impedido de ingressar na condução aquele que apresentar tais sintomas; e b) em vista do possível contágio comunitário, conforme relatório Epidemiológico da Secretaria de Saúde do Município de Passo Fundo, de 22/4/2020, limitada, neste aspecto, ao período de incubação de 14 dias, contados de 24/4/2020. No particular, afasto a exigência de realização de testes em todos os empregados antes do retorno ao trabalho, nos termos da decisão do ID f78d02d - 0020265-43.2020.5.04.0662, ressaltando, também, a necessidade de respeitar a normativa do Ministério da Saúde, que diante da escassez do insumo, deve decidir em qual parte da população aplicará os testes.

Defiro, por outro lado, a tutela de urgência requerida no pedido III, item 27.1 da ACP para que seja priorizada a comunicação / verificação de algum tipo de sintoma do Covid-19 antes do embarque do trabalhador no transporte para o trabalho, quando fornecido pelo empregador, devendo ser impedido de embarcar aquele que apresentar tais sintomas; bem como a segunda parte do pedido I, qual seja, o afastamento de todos os empregados da ré pelo período de 14 dias, contatos da interdição ocorrida em 24/4/2020.

Por fim, a empresa ré, deverá apresentar os laudos descritos no anexo da Resolução-RE, n. 09, de 16/1/2003 - Ministério da Saúde - ANVISA, com assinatura do responsável técnico, no prazo de 20 dias. Após, venham conclusos para análise da necessidade de verificação técnica a respeito, na forma dos artigos 765 da CLT e 156 do CPC.

Desta decisão, serão intimados: a) a empresa ré o sindicato pelo Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho; b) a União Federal, via sistema.

PASSO FUNDO/RS, 04 de maio de 2020.

LUCIANO RICARDO CEMBRANEL

Juiz do Trabalho Titular

Não ignoro, também, o fato de haver funcionários contaminados pelo Covid-19, mas estes restaram afastados do trabalho. No caso dos autos às exigências são inexequíveis e tampouco se sabe da sua eficácia. São inúmeras teses todos os dias sobre o Covid-19. Interditar a empresa totalmente implica no seu fechamento, pois da forma que o assunto é tratado sempre vai haver uma exigência a mais a ser cumprida.

E tais situações vão repercutir nos trabalhadores, suas famílias, e também na cadeia produtiva que envolve produtores rurais e terceiros.

Deve-se pensar não só na questão que envolve à reclamada, mas em toda a cadeia produtiva que envolve os produtores rurais, os fornecedores de animais, terceiros, e, principalmente os empregados da reclamada.

De qualquer forma, não tenho dúvidas de que decisão fundamentada em laudo técnico não é ilegal.

Voto pela denegação da segurança.

DEMAIS MAGISTRADOS:

Acompanham o voto do(a) Relator(a).

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR MARCOS FAGUNDES SALOMÃO (RELATOR)

DESEMBARGADOR MANUEL CID JARDON (REVISOR)

DESEMBARGADORA VANIA MATTOS

DESEMBARGADORA LAÍS HELENA JAEGER NICOTTI

DESEMBARGADOR MARCELO JOSÉ FERLIN D AMBROSO

DESEMBARGADOR GILBERTO SOUZA DOS SANTOS

DESEMBARGADOR ANDRÉ REVERBEL FERNANDES

DESEMBARGADOR JOÃO PAULO LUCENA

DESEMBARGADORA BRÍGIDA JOAQUINA CHARÃO BARCELOS

DESEMBARGADOR FABIANO HOLZ BESERRA

DESEMBARGADORA ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER

DESEMBARGADORA SIMONE MARIA NUNES

DESEMBARGADORA MARIA SILVANA ROTTA TEDESCO

DESEMBARGADOR ROSIUL DE FREITAS AZAMBUJA